domingo, 15 de novembro de 2015

A Mineração e Desenvolvimento Sustentável

A Mineração e Desenvolvimento Sustentável

  • Considerando a natureza exaurível intrínseca do recurso mineral, para que a mineração possa ser considerada uma atividade sustentável, de acordo com a perspectiva da “sustentabilidade sensata” (SERAGELDIN, 1995), ela precisa promover a equidade intra e inter-geração (AUTY & WARHURST, 1993). 
A mineração pode ser considerada sustentável, a partir da perspectiva da geração atual, se ela minimizar os seus impactos ambientais e mantiver certos níveis de proteção ecológica e de padrões de qualidade ambientais. Da perspectiva intergeracional, a mineração pode ser considerada uma atividade sustentável se ela garantir o bem-estar das gerações futuras, o que pode ser feito a partir do uso sustentado das rendas que a mineração proporcionou. Este artigo trata do primeiro requisito.
  • No Brasil, por volta de 1.700 municípios (30,6% do total) recebem recursos financeiros da Compensação Financeira pela Exploração Mineral (CFEM), mas apenas 27 respondem por 81% da arrecadação (ENRÍQUEZ, 2007). Destes, 15 foram escolhidos para compor a amostra da pesquisa empírica. 
Eles foram selecionados a partir de três critérios: 
  1. Valor anual da CFEM que cabe ao município ser superior a R$ 1 milhão (valores de 2003); 
  2. Peso da CFEM na receita pública municipal estar entre 5% a 30%; e 
  3. Representatividade nacional (região geográfica do município)
A representatividade geográfica é importante por causa da grande assimetria entre os indicadores socioeconômicos das regiões brasileiras. Acompanhando a institucionalização crescente das questões ambientais no mundo, o Brasil, desde meados dos anos 1980, vem estruturando um marco regulatório bastante vasto para tratar dos temas ambientais ligados à mineração. 
  • São exemplos disso os órgãos especialmente criados para lidar com o assunto, tais como o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), as Secretarias Estaduais e Municipais de Meio Ambiente, Conselhos Estaduais e Municipais de Meio Ambiente, entre outros, bem como as resoluções do Conselho Nacional de Meio Ambiente (CONAMA), em particular a 001/1986 e 237/1997, que tratam da exigência dos Estudos de Impacto Ambientais (EIAs) e demais instrumentos de comando e de controle como Relatórios de Impactos Ambientais (RIMAs), Planos de Controle Ambientais (PCAs), Relatórios de Controle Ambientais (RCAs), planos de monitoramentos, planos de fechamento de mina, apresentação dos estudos em audiências públicas, aprovação pelos conselhos estaduais e municipais de meio ambiente, entre outros. 
Afora esses instrumentos coercitivos, há também mecanismos indutores de mercado que exercem forte pressão para uma atitude ambientalmente mais pró-ativa, por parte da indústria mineral, tais como as negociações de ações das companhias mineradoras em bolsas de valores, além de instrumentos voluntários e de comunicação como a adesão aos programas de certificação ambiental internacionais da série ISO 14.000 e NOSA, por exemplo, ou a publicação dos indicadores de sustentabilidade o Instituto ETHOS, no Brasil, que, da mesma forma, contribuem favoravelmente para que as grandes companhias mineradoras assumam maior compromisso com a dimensão ambiental do desenvolvimento sustentável.
  • Todavia, isso não significa que a questão ambiental da mineração esteja totalmente resolvida. No Brasil, muito mais do que a base produtiva, os municípios se diferenciam por sua localização regional. Nesse sentido, a partir de um conjunto de indicadores ambientais dos municípios mineradores e de seus entornos não-mineradores, este artigo visa demonstrar que o contexto regional precisa ser considerado em uma estratégia de gestão ambiental da mineração.
Adicionalmente, o artigo chama atenção para o fato de que a recente reorientação das exportações minerais ao voraz mercado exportador asiático, em especial o chinês, pode representar ameaças aos avanços já conquistados.

Indicadores Ambientais:

Os indicadores ambientais analisados, longe de exaustivos, são os disponíveis a partir de informações secundárias que permitiram constituir um quadro comparativo entre o conjunto de municípios mineradores e os seus entornos não-mineradores. Nesse sentido, foram considerados cinco conjuntos de indicadores: 
  1. Institucionalização da dimensão ambiental, 
  2. Municípios mineradores e desmatamento (apenas para os municípios da Amazônia), 
  3. Municípios mineradores e incidência de doenças, 
  4. Condições do meio ambiente em municípios mineradores e 
  5. Políticas de meio ambiente das companhias mineradoras nos municípios de onde extraem os minérios.
Indicadores de institucionalização da dimensão ambiental:
  • Os indicadores de institucionalização do meio ambiente foram baseados nos levantamentos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2002. 
Ainda que parciais, eles oferecem bases para fazer um interessante quadro comparativo entre os municípios mineradores e seu entorno não-minerador. Para sua elaboração foram consideradas as seguintes variáveis: conselho municipal de meio ambiente (CMMA) ativo (que se reuniu nos últimos 12 meses); despesa per capita com o meio ambiente; órgão ambiental, lei ambiental e unidades de conservação (UCs) municipais. 
  • Foi atribuído um ponto para a existência de cada uma das variáveis e zero para a sua não-existência. A pontuação máxima que um município pode ter é cinco, caso existam nele todas as variáveis. A pontuação mínima é zero, na hipótese de inexistência total.
Os municípios mineradores foram os que receberam as maiores pontuações, com destaque para Itabira (MG), Mariana (MG) e Corumbá (MS). O único município minerador que recebeu “zero” foi Oriximiná (PA). A média para o conjunto de municípios mineradores foi de 3,3, enquanto que para o conjunto de municípios não-mineradores foi de 2,1, ou seja, uma diferença de 60%.
  • Esses resultados são um forte indício de que a mineração de larga escala contribui positivamente para a institucionalização da dimensão ambiental nos municípios onde ela ocorre. Todavia, quando se observa as pontuações no interior dos municípios mineradores, verifica-se um componente regional forte: os municípios das regiões Norte e Nordeste com os menores pontos e os municípios das regiões Sul e Sudeste com pontos maiores. 
A única exceção é Parauapebas (PA). Isso significa que a institucionalização ambiental não é uma realidade comum a todos os municípios de base mineradora. Ela é bem mais forte nas regiões Centro-Sul do que na região Norte do Brasil.

Municípios mineradores e os indicadores de desmatamento:
  • Informações disponíveis e sistematizadas sobre desmatamento municipal existem apenas para os municípios da Amazônia - projeto PRODES do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). Nesse sentido, a Tabela 1 apresenta informações de desflorestamento (% em relação à área municipal), de 2000 e de 2005, e a taxa de desmatamento dos municípios mineradores do Estado do Pará e seus entornos. 
Nesse período não houve alteração dos índices de desmatamento dos municípios mineradores do Amapá e entorno. Entre 2000 e 2005, Vitória do Jari apresentou o mesmo percentual de 7%, assim como Laranjal do Jari (0%), somente Mazagão passou de 0% para 1%.
  • Verifica-se grande assimetria entre as taxas de desmatamento dos municípios do Pará. É provável que elas sigam muito mais um padrão microrregional de uso e ocupação do solo do que sejam determinadas pela existência da mineração. Um exemplo disso é Oriximiná que foi o primeiro município paraense a abrigar um empreendimento minerador de larga escala voltado, principalmente, para o mercado exportador. Isso ocorreu no final dos anos 1970.
Contudo, tanto ele como o seu entorno não-minerador apresentam uma das mais baixas taxas de desmatamento do Estado. Isso é o contrário do que ocorre com a região de Carajás que, com exceção de Parauapebas (por causa da política de áreas reservadas da Companhia Vale do Rio Doce - CVRD), registra uma das taxas mais elevadas de desmatamento do Estado.
  • No Nordeste Paraense, uma das regiões de mais antiga ocupação do Estado e, por conseguinte, uma das mais desflorestadas, se verifica rápida expansão do desmatamento, provocado, principalmente, pela expansão do agronegócio da soja. Portanto, é muito provável que Ipixuna do Pará, município que iniciou sua produção de caulim em 1996, assim como o seu entorno não-minerador, esteja seguindo um padrão de desmatamento determinado por outra dinâmica produtiva que não a mineração.
A possibilidade de que a mineração de larga escala possa contribuir para o desenvolvimento da Amazônia e que seja ambientalmente não agressiva, tem sido debatida por vários autores por autores. Hope (1992) condena as formas de exploração madeireira e pecuária da Amazônia e afirma que a mineração é a atividade que oferece a melhor chance para acessar a riqueza da região sem destruir o patrimônio natural e a diversidade única de plantas e animais ali encontrados. Smith et al. afirmam que os impactos ambientais dos empreendimentos mineiros de larga escala são localizados e de “mínima significância ambiental” (SMITH et al., 1995, p. 30).
  • Muitos autores não concordam essa visão. Para Curi (2002), não passam de mitos as afirmações de que “os impactos relacionados à mineração são limitados a uma área muito pequena” e de que “a mineração é um uso temporário do terreno”, pois, quando se consideram todas as etapas envolvidas, a atividade mineral abrange um espaço muito maior que o ponto de referência da mina, além disso, não é o tempo de vida útil da jazida que indicará o nível de comprometimento do meio ambiente, mas sim como serão manejados os impactos, principalmente, os impactos mais graves e duradouros que se referem à destruição dos habitats naturais, à drenagem ácida e seus efeitos na qualidade da água e na vida silvestre, além dos grandes acidentes com barragens, pilhas de estéril, entre outros.
Municípios mineradores e incidência de doenças:
  • Informações sobre incidência de morbidade hospitalar, segundo a distribuição percentual das internações por grupos de causa, disponibilizadas para todos os municípios brasileiros pelo Banco de dados de Sistema Único de Saúde (DATASUS), para o ano de 2005, permitem verificar associação entre certos tipos de doenças consideradas “típicas de mineração” nos municípios mineradores do estudo.
As seis categorias selecionadas foram as doenças mais citadas na literatura sobre o tema e nas entrevistas de campo. As informações se referem às médias observadas para o conjunto de municípios minerador e entorno não-minerador, bem como a diferença (em termos percentuais) observada entre as médias. 
  • A avaliação das médias amostrais foi feita com o teste “estatística t”, com o nível de significância de 5%. Os resultados não revelaram diferenças significativas entre as médias do conjunto de municípios minerador e não minerador, mas revelaram diferenças inter-regionais, quanto às doenças infecto-contagiosas.
As doenças infecto-contagiosas (infecciosas e parasitárias) estão intimamente relacionadas às condições socioeconômicas, especialmente, à renda e à educação. Portanto, era previsível que o conjunto de municípios mineradores das regiões Norte e Nordeste apresentasse média de internação hospitalar para esse tipo de doença superior à dos municípios mineradores das demais regiões.
  • Quanto às doenças do aparelho respiratório, causou surpresa não haver diferenças significativas de médias, nem entre o conjunto de municípios mineradores e não-mineradores e nem entre o conjunto de mineradores das duas regiões. Surpreende também a cidade de Itabira (MG) não estar encabeçando a lista de municípios mineradores mais afetados por doenças respiratórios, uma vez que esse problema foi mencionado durante a visita no município. 
Todavia, este resultado está de acordo com a análise epidemiológica sobre o impacto da poluição do ar na saúde da população de Itabira (MG) que foi realizado pelo Laboratório de Poluição Atmosférica Experimental (LPAE) da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), em 2005.
  • Esses resultados são insuficientes para afirmar que municípios de base mineira estejam livres de algum tipo específico de doença “típica de mineração”. Significa apenas que a amostragem do ano de 2005 para o conjunto de municípios minerador e não-minerador, não revelou essa associação. Dado que surpreende, pois a expectativa era de se encontrar maior incidência de doenças respiratórias entre o conjunto de municípios mineradores. 
Como hipótese, pode-se especular que normas ambientais mais rigorosas sobre os limites das emissões atmosféricas (Resoluções CONAMA 003/1990 e 382/2006, entre outras) têm estimulado o desenvolvimento de processos mais comprometidos com a prevenção e o controle de emissões de particulados pela extração mineral.

As condições do meio ambiente em municípios mineradores:
  • As informações sobre as condições do meio ambiente nos municípios do estudo estão baseadas nos indicadores elaborados pelo IBGE (2002) e nas pesquisas de campo (apenas para os 15 municípios mineradores). 
Elas se referem às alterações ambientais relevantes e às atividades econômicas que as provocaram; elas indicam também se o meio ambiente alterado prejudicou o desenvolvimento de alguma atividade econômica. A partir dessas informações foi possível observar três padrões de respostas para os conjuntos de municípios mineradores e não-mineradores:
  • Grupo 1 - municípios de base mineira que sequer mencionam a existência de mineração em seu território, muito embora reconheçam que outras atividades têm provocado problemas ambientais (Amapá, Goiás e Mato Grosso do Sul);
  • Grupo 2 - municípios não-mineradores que foram afetados em seu meio ambiente pela atividade de mineração (Santa Catarina);
  • Grupo 3 - municípios de base mineira que percebem problemas gerados pela atividade mineral (Minas Gerais e Pará).
Grupo 1 - Municípios de base mineira que não se referem à existência de mineração Durante as entrevistas com representantes das sociedade local, em Vitória do Jari (AP), não foram mencionados problemas ecológicos relacionados à extração de caulim da mina do Filipe pela mineradora CADAM, mas sim problemas urbanos por falta de saneamento básico de água tratada, de pavimentação das ruas etc. É provável que o tipo de minério e a forma de extração sejam mesmo pouco impactantes, além do fato de a empresa destinar o seu produto ao exigente mercado europeu, muito rigoroso com normas ecológicas.
O caso dos municípios goianos é distinto. Em Crixás (GO), sede da Mineração Serra Grande (MSG), grupo Anglo Gold, a extração de ouro é feita em mina subterrânea, o que evita o impacto visual. Minaçu (GO) sofreu um grande impacto provocado pela construção de duas usinas hidrelétricas Cana Brava e Serra da Mesa.  A atividade mineradora, que existe desde a origem da cidade, sequer foi mencionada tanto nos levantamentos do IBGE, quanto nas entrevistas em campo.
No caso de Corumbá (MS), de acordo com o Secretário Municipal de Governo do município, José Antônio Assad, a mineração é uma atividade positiva para o município, mas ressalta que é preciso que se estabeleçam regras e limites. Ele afirma que a mineração não conflita com o turismo (outro segmento econômico forte do município), pois a atividade turística praticada no Pantanal é contemplativa e a mineração não afeta a paisagem pantaneira por ser uma atividade pontual. Para o Secretário, a idéia de “o Pantanal se transformará em Cubatão” é difundida a partir de um debate de cunho muito mais ideológico do que fundamentado em bases científicas.
A percepção do Secretário é compartilhada entre os representantes da mineração, mas eles reconhecem que há uma visão negativa dessa atividade, principalmente, quando se trata de Minas Gerais, na região do quadrilátero ferrífero. Isso porque, como a mineração começou há muitos anos naquela região, as técnicas empregadas não consideravam os aspectos ambientais e sociais. A mineração mal atendia as questões técnicas e econômicas; portanto, foram criados graves passivos ambientais e trabalhistas.
Assim, a mineração se expandiu em quantidade e tamanho, afetando não apenas o município minerador, como também o seu entorno. As empresas mineradoras entrevistadas (mineração Corumbaense – Rio Tinto – e Urucum Mineração – CVRD) assumem que Corumbá está localizado em uma área de grande sensibilidade ambiental. A Rio Tinto afirma já adotar padrões internos bem mais rigorosos que os limites legais para a emissão de resíduos e efluentes, consumo de água etc. Praticamente a mesma visão é compartilhada pelo gerente da Mineração Urucum, do Grupo CVRD.
Grupo 2 - Municípios não-mineradores afetados pela atividade mineral Os municípios não-mineradores catarinenses, situados no entorno dos municípios de base mineira, estão no rol dos que se sentem ambientalmente impactados pela mineração. O histórico da mineração do carvão em Santa Catarina remonta aos anos 1950.
Nessa época, a questão do meio ambiente era desconsiderada. Aliada ao tipo de mineralização própria do carvão (rico em pirita, substância altamente poluente quando em contacto com o oxigênio), a atividade provocou graves passivos ambientais para a região, tais como: acidificação dos rios e córregos, grandes áreas degradadas com o estéril, comprometimento das águas subterrâneas, entre outros. Segundo Bortot (2002), a região carbonífera de Santa Catarina é considerada uma das regiões mais críticas em termos de poluição de água, solo e ar, em todo o Brasil.
Em contrapartida, os municípios catarinenses apresentam um dos mais altos escores de IDH do Brasil. Aqui parece haver um trade-off explícito entre qualidade ambiental e padrões socioeconômicos. Uma questão que emerge é saber se esse trade-off se aplica aos novos municípios mineradores ou se as regras ambientais existentes serão capazes de conter as tendências históricas da mineração.
Grupo 3 - Municípios de base mineradora que percebem problemas gerados pela mineração Os municípios mineradores de Minas Gerais, particularmente, Itabira e Paracatu, reconhecem plenamente os problemas ecológicos provocados pela mineração, pelas evidentes marcas em suas paisagens e pelo comprometimento de grandes áreas, em um território onde o custo de oportunidade do uso do solo é alto, por causa do uso alternativo no agronegócio (Paracatu) e da própria área urbana (Itabira).
No início dos anos 1980, o município de Oriximiná, no Pará, foi penalizado com o problema do assoreamento do Lago Batata, provocado pelos resíduos da lavagem da bauxita metalúrgica extraída pela Mineração Rio do Norte (MRN). Além de comprometer a imagem da empresa, esse passivo ambiental onerou significativamente os seus dispêndios nessa área.
Silva (Enriquez) (1999) demonstrou que a MRN tem um dos mais altos custos ambientais, entre as empresas minero-metálicas instaladas no Pará, por causa dos dispêndios com a recuperação do lago e das áreas que foram degradadas pelos despejos indevidos dos rejeitos da bauxita. A partir desse episódio, a empresa se modernizou e inovou em seus métodos de descarte, conquistando muitos prêmios de qualidade ambiental e passando a ser um modelo para outras empresas mineradoras. Todavia, apesar disso, o passivo persiste. Em Parauapebas e Canaã dos Carajás, a presença da atividade mineral é mais perceptível, pela proximidade da mina em relação aos centros urbanos. Contudo, tanto em Carajás como no Sossego, os locais da atividade mineradora estão cercados por áreas legalmente protegidas. Ipixuna do Pará não percebe nenhum problema, possivelmente, por causa do tipo de minério extraído – o caulim, com método de extração muito semelhante ao da Mina do Filipe, em Vitória do Jari (AP) e também pelo fato de a mineração estar muito distante do centro urbano.
  • Desse modo, conclui-se que não há um padrão homogêneo quanto à condição do meio ambiente das cidades mineradoras. O maior ou menor grau de impacto depende de vários fatores, entre os quais: o tipo de minério, a forma de extração, as técnicas adotadas, o período de implantação do projeto e outros. 
De uma forma geral, percebe-se que prevaleceu um padrão ambiental reativo nas regiões Sul e Sudeste do Brasil, ou seja, a mineração existente há muitas décadas teve de se adequar às novas normas ambientais, e um padrão bem mais pró-ativo no Norte, com as suas minas bem mais jovens, que já nasceram incorporando novas tecnologias ambientais e, em muitos casos, adotando padrões de emissão acima dos determinados pela legislação nacional. Essa constatação vem ao encontro da tese de Cavalcanti (1996), cujos estudos de caso sobre a CVRD, em Carajás (PA) e Itabira (MG) demonstram esse comportamento.

Políticas de Meio Ambiente: 
Das empresas nos municípios mineradores:

A  seguir, as informações obtidas a partir das empresas mineradoras entrevistadas, em 2005 e 2006. Ela apresenta informações sobre o tipo de minério extraído, ano da instalação do projeto, expectativa de vida útil da mina, destino da produção e informações gerais sobre a política ambiental da companhia. A visão agregada das informações pode ser feita a partir de três perspectivas: 
  1. O padrão de qualidade ambiental (ecológico) adotado pelas empresas; 
  2. A iniciativa de adoção dos padrões ambientais; e 
  3. A relação entre o padrão ambiental, a idade da mina e a região geográfica em que está situada.

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Padrão de qualidade ambiental adotado pelas empresas:
  • Das 18 companhias mineradoras entrevistadas, 50% são diretamente ligadas ao Grupo CVRD (Tabela 4). Destas, oito destinam a sua produção ao mercado exportador e apenas uma – a mina Taquari/Vassouras de potássio, em Rosário do Catete (SE) – vende exclusivamente para o mercado interno. Das nove empresas não-CVRD visitadas, apenas duas não vendem para o exterior – a Carbonífera Criciúma, em Forquilhinha (SC), e a Caraíba Mineração, que produz cobre no município de Jaguarari (BA). As três empresas – CVRD e não-CVRD – que destinam suas vendas para o mercado doméstico não têm certificações ambientais (ISO 14001).
Das 15 empresas que destinam as suas vendas para o exterior apenas três não têm certificação ISO 14001: a Mineração Serra do Sossego, em Carajás. (que iniciou sua produção em 2004, mas estava em fase de certificação), a Urucum Mineração (CVRD), produz ferro e manganês e a Mineração Corumbaense (Grupo Rio Tinto), produz ferro, ambas no município de Corumbá (MS). Essas duas empresas destinam as suas vendas prioritariamente ao Mercosul (Argentina e Paraguai) e não sentem fortes pressões para se certificarem. 
  • No entanto, todas adotam Sistemas de Gerenciamento Ambiental (SGA) e a certificação ISO 14001 está em seus planos.Portanto, 80% das empresas que vendem para o exterior têm certificação ISO 14001. Isso é um forte indício de que o mercado exportador é um importante fator de pressão pró-ecologia.
O mecanismo dessa influência ainda não é perceptível diretamente via ampliação de mercado, mas principalmente, por intermédio de diferencial competitivo, de custos evitados (com acidentes de trabalho, passivos ambientais, processos judiciais etc.), manutenção de mercados, reputação e outros benefícios que resultam em uma mudança cultura pro - ativa em favor do meio ecológico.
  • O maior comprometimento da equipe técnica com padrões ambientais proporciona ganhos econômicos pela redução do desperdício e pela economia de recursos; as certificações ambientais proporcionam a melhoria da imagem empresa e conseqüente simpatia dos acionistas, geram também diferencial competitivo quando o produto vendido é commodity; além da possibilidade da criação de novos produtos com maior agregação de valor e maior conteúdo tecnológico. 
Esses são alguns dos exemplos dados pelas companhias mineradoras de ganhos obtidos a partir de um sistema de certificações e/ou de gerenciamento ambiental. Isso demonstra a força desses instrumentos voluntários, induzidos pelo mercado, no sentido de favorecer melhores padrões ambientais na mineração e, por conseguinte, nas cidades onde atuam.

Iniciativa de adoção dos padrões ambientais:
  • As decisões sobre a adoção de práticas ambientais nas empresas visitadas partiram de decisões judiciais (Carbonífera Criciúma, Forquilhinha - SC, CVRD e Itabira - MG) ou do corpo dirigente da empresa, porém induzidos por perspectivas de ganhos em bolsa de valores, pela pressão dos financiadores, compradores e outros grupos de pressão. Um exemplo contundente de implantação de um sistema de gestão ambiental provocado por decisões da Justiça é o da CVRD, em Itabira.
O caso da Carbonífera Criciúma, Forquilhinha (SC), ilustra também a adoção de um sistema de gestão ambiental provocado por exigências legais. Diferentemente das empresas mineradoras exportadoras que atuam na Amazônia, na Carbonífera Criciúma a motivação para buscar certificações foi proveniente de normas legais, primeiramente da sentença solidária, de 2000, e, mais recentemente, pelo Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), de de 2005. Como experiências diametralmente opostas se destacam os empreendimentos mineradores da região Norte do Brasil, particularmente em Carajás, em Parauapebas (PA).
O caso de Parauapebas (PA) - Projeto Ferro Carajás – CVRD:
Nos anos 1980, a criação de seis áreas reservadas no entorno da CVRD, em Carajás (PA), foi uma hábil estratégia que a empresa ajudou a implantar para a defesa de suas áreas de mineração. Cercada de espaços especialmente protegidos, em um contexto histórico e regional que não valorizava fortemente esse tipo de ação, a CVRD foi inovadora e ousada em sua política ecológica. Essa iniciativa possibilitou a proteção de suas jazidas por um “cinturão verde”, evitando assim as constantes invasões de garimpeiros, devastação dos madeireiros ou ocupação dos sem-terra, entre outros, nas suas áreas e em áreas adjacentes.
Essa estratégia foi de grande importância para a manutenção de espaços preservados em uma região fortemente afetada pela agressiva ação antrópica, pois ela está dentro da faixa do denominado “arco do desmatamento”.
No entanto, o que era, nos anos 1980, um “cinturão verde” para a proteção das jazidas acabou se transformando, nos anos 2000, em uma “amarra ecológica” à extração minerária e um complicador extra para a obtenção das licenças ambientais das novas minas que estão dentro da Floresta Nacional (FLONA) de Carajás. Muito embora a legislação que criou a FLONA Carajás (Decreto nº 2.486, de 2 de fevereiro de 1998) tenha garantido os direitos minerários pré-existentes, o licenciamento ambiental que, na hipótese de não-existência da FLONA, poderia ser feito no âmbito estadual, passou a ser de competência federal, por intermédio do IBAMA. Além disso, todo o procedimento deve estar em conformidade ao plano de manejo, que deve ter a anuência do IBAMA.
Em síntese, a adoção de padrões ambientais mais restritos e a adesão aos programas voluntários de certificação são percebidas como valores importantes, por parte das companhias mineradoras. Maior comprometimento da mão-de-obra, diferencial competitivo, cumprimento de requisitos legais para negociar ações em bolsas, atrativo adicional, melhorias na gestão de resíduos, mudança de postura quanto às questões ambientais e a própria explicitação da política ambiental, são alguns dos aspectos positivos destacados pelas empresas que adotam sistemas de gestão ambiental, quer voluntários (certificações), quer mandatórios (imposição legal).
A relação entre o padrão ambiental: 
A idade da mina e a região geográfica:
  • No Brasil, a atividade mineradora de larga escala é recente. Do universo estudado, a mina mais antiga é a da CVRD de Itabira (MG) e a mais jovem é a de Canaã dos Carajás (PA), também da CVRD. Nesse sentido, foi verificada uma forte associação entre a idade da mina, o seu potencial de impacto ambiental e a localização geográfica. As minas mais velhas têm muito mais passivos, não somente por causa da idade, mas, principalmente, pelo descaso com o meio ambiente , conforme evidenciado pelas entrevistas. As minas mais jovens, via de regra, já nascem incorporando princípios de gestão ambiental e, portanto, têm menor potencial de gerar passivos ambientais graves.
A tendência histórica da atividade mineradora no Brasil é se expandir para a região Norte, cujo território está ainda pouco explorado. Muitas das minas das regiões Sudeste e Sul já estão em fase de esgotamento. No entanto, os crescentes preços que commodities minerais vêm alcançando nos últimos anos, tem permitido o aumento da vida útil da mineração nessas regiões.
  • As entrevistas revelaram que, no Brasil, distintamente do Canadá, parece ser que mais importante que o tempo da mina e a localização geográfica do empreendimento é o destino das vendas o principal motivador para uma gestão ambiental mais efetiva. Os casos das minas da CVRD ilustram essa situação. A mina de potássio Taquari-Vassouras, em Rosário do Catete (SE), por exemplo, iniciou as suas atividades em 1985, mesma época em que a mina de ferro de Carajás, em Parauapebas (PA), entrava em operação. 
Toda a produção da mina de potássio é vendida para o mercado interno, enquanto a de Carajás é toda exportada, principalmente para a Europa e o Japão. Em Carajás, a CVRD foi uma das primeiras empresas mineradoras do mundo a obter a certificação ISO 14000 (em 1996), enquanto a mina de potássio, até então, não tem nenhum certificado ambiental.
  • Nos últimos anos, a intensificação das exportações para a China pode representar uma ameaça às conquistas ambientais já alcançadas pelas companhias mineradoras que atuam no Brasil, especialmente porque a China já importa em torno de 60% do minério de ferro produzido pelo Brasil (dados de 2006, SECEX, Sistema Alice) e a proporção das exportações brasileiras para esse mercado é crescente.
Em 1985, as exportações brasileiras para a China não alcançavam seque 05,% , vinte anos depois já representam mais de 6% (Tabela 5). Isso preocupa, entre outros motivos, porque em recente pesquisa sobre os padrões ambientais em 118 países, a China ficou na 100ª posição no que se refere ao quesito “modernização ecológica” (BBC-Brasil, de 28/01/2007).
  • Considerando-se que, no Brasil, os mercados internacionais, especialmente o europeu, têm representado um forte elemento de pressão em prol de uma mineração mais responsável ambientalmente, é preciso ficar atento para que não ocorram retrocessos com esse recente movimento em direção ao mercado asiático.
Outras Considerações:

Os indicadores ambientais apresentados permitiram formar um quadro comparativo entre o conjunto de municípios mineradores e os seus entornos não-mineradores. A partir dessas observações, pode-se concluir que os problemas ecológicos provocados pela atividade mineradora dependem:
  • Do tipo de minério extraído, das características físicas da mineralização, da tecnologia existente etc;
  • Do destino da venda dos minérios (mercado externo ou doméstico):
  • Da data em que se iniciou a sua explotação, se antes ou depois das exigências legais;
  • Da região geográfica. De forma ampla, o padrão ambiental da indústria de mineração é reativo nas regiões Sul e Sudeste e é pró-ativo no Norte do Brasil.
Nesse sentido, não se pode dizer que existe um único padrão de impactos ecológicos da atividade mineradora, assim como não foi possível estabelecer uma associação direta entre certos tipos de doenças e as regiões mineradoras. 
  • Os indicadores de desflorestamento, também não permitem afirmar que a mineração contribui favoravelmente para o desmatamento. Portanto, não é possível pensar em um modelo único de gestão ambiental para a mineração, tendo em conta as profundas assimetrias entre os municípios brasileiros. Ela precisa ser contextualizada, a partir de uma base de conhecimento da realidade na qual a atividade ocorrerá.
Como regra geral, a mineração de larga escala destina sua produção ao mercado exportador. A crescente concorrência e as exigências desse mercado requerem padrões ambientais rigorosos. Não raras vezes, as companhias mineradoras adotam padrões acima das normas legais vigentes. 
  • Um exemplo disso é a adesão voluntária aos programas de certificação ambiental, como os da série ISO 14000. Esse comportamento está de acordo com o que verificaram Hilson & Murk (2000), ao ressaltarem que o arcabouço regulatório difere significativamente entre países em todo o mundo e que países subdesenvolvidos têm regras muito mais frouxas e menos rigor que os países desenvolvidos. Portanto, estar em conformidade com a legislação local não significa que ocorra uma excelente prática ambiental. Assim, a venda externa funciona como um verdadeiro freio às práticas ambientais predatórias.
No entanto, com a diversificação dos mercados globais e o intenso crescimento de economias, como a da China, por exemplo, que não apresentam padrões ambientais rigorosos, é necessário estar alerta para possíveis retrocessos. Isso seria muito negativo, por duas principais razões: 
  1. A mineração está se expandindo para regiões ricas em recursos naturais e ambientais que carecem de proteção e 
  2. Ainda há necessidade de aperfeiçoamento dos instrumentos hoje existentes.
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