quinta-feira, 17 de dezembro de 2015

Aquecimento Global, MDL e a Biodiversidade

Aquecimento Global

  • Um dos atuais problemas que mais preocupam ambientalistas, autoridades políticas, empresas e a sociedade de maneira geral é o aquecimento da atmosfera, que traz consigo mudanças potencialmente irreparáveis no equilíbrio climático do planeta. 
Com isso é possível que ocorram problemas significativos na economia, em função de impactos nos mais diversos setores como no sistema de produção agrícola e florestal, área de saúde, segurança, etc.
A concentração dos chamados “Gases de Efeito Estufa” (GEE4) tem aumentado significativamente desde a Revolução Industrial, a qual iniciou o deslocamento intenso para a atmosfera de gases de efeito estufa fixado como petróleo subsolo, para o desenvolvimento de atividades industriais, produção e consumo de energia elétrica, agricultura etc. 
  • Além disso, o desmatamento e gerenciamento indevido do lixo assim como os mais variados tipos de resíduos vem contribuindo para o mesmo problema. Calcula-se que a alteração na concentração dos GEE poderá desencadear nos próximos cem anos um aumento da temperatura média anual do planeta, entre 1,4 e 5,8 ºC (IPCC5), durante o século XXI.
O aumento da temperatura da Terra, diretamente, provoca o aumento do nível dos oceanos pela expansão térmica da água e derretimento de geleiras, colocando em risco as zonas costeiras, cidades situadas abaixo do nível do mar e algumas ilhas. Nessa mesma linha, a água do mar poderá se misturar com a água doce, diminuindo a água potável disponível no planeta. 
  • Outro risco é de que o regime de chuvas sofra modificações, provocando enchentes ou intensos períodos de seca, o que resultaria na redução das safras agrícolas, inclusive por dificultar a capacidade de previsão climática que existe nos dias de hoje.
No entanto, uma das principais conseqüências do aquecimento global está na intensificação de ocorrência de fenômenos naturais, tais como furações, os quais podem se tornar mais freqüentes e menos previsíveis. 
  • Como conseqüência geral, surgem problemas sociais derivados de mudanças no equilíbrio ambiental atual, como por exemplo, o deslocamento de áreas agricultáveis e aumento de doenças e pessoas infectadas, os quais podem gerar conflitos por terra e necessidade de melhor infra-estrutura hospitalar, assim como respostas adequadas a eventos catastróficos como o exemplo recente do furacão Katrina, nos EUA.
Protocolo de Quioto:
  • Durante a Conferência das Nações Unidas para Desenvolvimento e Meio Ambiente (UNCED) em 1992, foi adotada uma convenção, a UNFCCC (do inglês - United Nations Framework Convention for Climate Change). Com sua implantação, temos hoje o seu desdobramento no Protocolo de Quioto. 
Tal Protocolo de Quioto (PQ) é um tratado complementar à Convenção do Clima, que foi adotado durante a terceira Conferência das Partes (COP3), realizada em Quioto, no Japão, em dezembro de 1997. O PQ entrou em vigor em fevereiro de 2005 e tem como meta principal reduzir as emissões de GEE pelos países industrializados (chamados de Anexo I na Convenção ou B no Protocolo), propondo a redução a níveis, pelo menos 5% abaixo dos níveis observados em 1990, no período compreendido entre 2008 e 2012. 
  • Para auxiliar no cumprimento das metas de redução foram estabelecidos três - “mecanismos de flexibilização”: Implementação Conjunta (ou Joint Implementation - J1), Comércio de Emissões (ou Emissions Trading - ET) e o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo - MDL (ou Clean Development Mechanism - CDM). O Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) é o único desses mecanismos que envolve a participação de países em desenvolvimento.
Para não comprometer as economias desses países, o PQ estabeleceu que caso seja impossível atingir as metas estabelecidas por meio da redução das emissões dos gases, os países poderão adquirir créditos de outras nações que possuam projetos de Mecanismo de Desenvolvimento Limpo, através de instrumentos econômicos ou transferência de tecnologias.

Mecanismo de Desenvolvimento Limpo:
De maneira geral, os projetos de MDL podem ser divididos em duas categorias:
  • (I) “projetos de redução de emissões”, principalmente associados ao deslocamento de emissões oriundas da queima de combustíveis fósseis e/ou captura e queima de metano e; 
  • (II) “projetos de sequestro de carbono”, relacionados à captação e estocagem de carbono em florestas. 
O Projeto de MDL é representado pelo Documento de Concepção do Projeto (PDD - Project Design Document, em inglês). 
  • O PDD estabelece uma linha de base que é “o cenário que razoavelmente representa a soma das mudanças nos estoques de carbono nos reservatórios, dentro dos limites do projeto, que teriam ocorrido na ausência das atividades de projeto propostas”. Com a implementação do projeto ocorre um ganho adicional de carbono. 
Também é previsto no PDD um monitoramento das atividades do projeto, necessário para a comprovação periódica de que as remoções de CO2 estimadas no projeto, realmente estão sendo efetuadas. Assim, o PDD tem a função de representar o empreendimento em questão para ser considerado dentro do âmbito do Protocolo de Quioto e, especificamente, ser levado ao registro no Conselho Executivo do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo – MDL, para culminar em reduções certificadas de emissão. 
  • Na elaboração do PDD, um dos primeiros passos é a avaliação da elegibilidade. O projeto é considerado elegível quando atende integralmente às proposições de cada critério. Um critério não atendido é suficiente para torná-lo inelegível. 
Um projeto se torna elegível quando o reflorestamento das áreas desmatadas antes de 1990 foi efetuado após o ano 2000. O projeto também deve atender ao requisito da adicionalidade, que corresponde à mudança no cenário de referência (redução de emissão ou sequestro) que ocorre como resultado de ação modificadora.

Biodiversidade 

Oportunidades no Protocolo de Quioto:
  • Uma das grandes oportunidades atualmente é a geração de energia a partir de resíduos ou sub-produtos. Os projetos de co-geração a partir do bagaço da cana, por exemplo, geram créditos e estão sendo implementados. 
Espera-se que um grande número de projetos seja apresentado utilizando este tipo de modelo de projeto. Isto abre margem para outras oportunidades, como o aproveitamento de palha de arroz, resíduos da indústria madeireira, o que oferece grande oportunidade para o setor florestal.
  • Dentre outras atividades de energia, o manejo de resíduos sólidos urbanos, para aproveitamento do biogás na produção de energia elétrica, é uma atividade com grande potencial, especialmente por já existir atualmente metodologias aprovadas. Nessa mesma linha, o aproveitamento do gás metano proveniente de dejetos de animais surge como outra atividade redutora de emissões.
Ainda no âmbito energético, o biodiesel, possui grande potencial, especialmente, no que tange a substituição de fonte fóssil. Além de gerar diferentes externalidades positivas no âmbito social. Porém, por se tratar de um programa de governo, ainda apresenta uma série de barreiras técnicas e de viabilidade econômica a serem transpostas.
  • As atividades florestais podem se beneficiar de créditos pela substituição de fontes de energia fóssil (carvão mineral) por fonte de energia renovável (carvão vegetal) em siderurgias. Outra possibilidade seria o uso dos resíduos de serrarias para geração de energia por biomassa, já que a eficiência do aproveitamento da madeira é de cerca de 50%.
Neste contexto de troca de fonte de energia, florestas energéticas podem além de substituir localmente o combustível fóssil, substituir também parte da geração térmica da rede (interligada). O tema do sequestro de carbono atmosférico, através do crescimento vegetal, (atividades adicionais no setor florestal), vem sendo debatido durante todo o processo de estabelecimento da Convenção do Clima. Como alternativa eficaz, o sequestro de carbono representa, em algumas regiões do planeta, um excelente meio de auxiliar nos objetivos da Convenção. 
  • A retirada do gás carbônico da atmosfera é uma forma de equilibrar a emissão de gases poluentes. A derrubada de florestas e o uso em massa de combustíveis fósseis emitem carbono na atmosfera, ao passo que manter florestas intactas e reflorestar ajuda na absorção desse gás presente no ar. Entretanto, nem todas as atividades florestais são elegíveis ou mesmo adicionais. É importante analisar cada caso setorial.
No que tange às atividades de florestamento e reflorestamento, uma das interessantes oportunidades a serem implementadas no contexto da Convenção do Clima e Protocolo, é a recuperação de áreas degradadas de Áreas de Preservação Permanentes (APP) e Reserva Legal (RL). A inclusão dessas atividades no contexto do mercado de carbono é um assunto que vem sendo debatido fortemente.
Baseando-se no livro – “Áreas de Preservação Permanente e Reserva Legal no contexto da mitigação de Mudanças Climáticas” (MANFRINATO et al., 2005), pode-se dizer que:
Com base no Código Florestal Brasileiro, a recomposição da vegetação nas APP não é obrigatória. Obrigatório, é o isolamento e seu subseqüente abandono. No caso da Reserva Legal, a legislação determina que esta seja recomposta em um prazo de 30 anos. Nota-se que, tais procedimentos não garantem, necessariamente, a recuperação da vegetação nativa. Primeiro porque, no caso das APP não se trata de uma ação obrigatória e segundo, tanto para as APP quanto para as RL, a ineficácia dessas normas no Brasil reduz a ação como mecanismo de comando e controle de áreas naturais protegidas;
Como a recomposição da RL é obrigatória no prazo de no máximo 30 anos, um reflorestamento mais intenso e num período de tempo mais curto poderia ser considerado adicional.
  • A Convenção do Clima, juntamente ao Protocolo de Quioto, na busca pela estabilização das concentrações de GEE, propõem alternativas adicionais, de forma a modificar as práticas predominantes em meios produtivos.
Assim, dado que as legislações nacionais e internacionais vigentes atualmente no Brasil, neste caso, Florestal e Climática, encontram-se sinérgicas por preconizarem o estabelecimento de um ambiente ecologicamente equilibrado e porque o Código Florestal não vem cumprindo com o seu objetivo final, o mecanismo de mercado advindo do Protocolo de Quioto pode ser o instrumento facilitador do cumprimento da legislação, além de promover benefícios adicionais ao que se observa na prática. Isso pode permitir inclusive a conservação de áreas de importância maior sob o ponto de vista ecológico.

Outras oportunidades não vinculadas ao Protocolo de Quioto:
  • O mercado de carbono é uma área em total expansão. Deste mercado ambiental de fluxo de carbono gera-se além do benefício ambiental, um ativo comercial bastante lucrativo para empresas que estão investindo em projetos com base nos benefícios do Protocolo de Quioto.
A criação desse um novo ativo comercial ou financeiro propiciou o estabelecimento de um novo mercado, no qual as instituições interessadas têm construído uma estrutura organizada para o carbono. Esse mercado tem se dividido principalmente entre os comercializadores de reduções de emissões provenientes de atividades de projetos que atendam as especificações da Convenção. 
  • Entretanto existem outros mercados considerados alternativos ao Protocolo de Quioto, um exemplo disso é o mercado europeu de emissões - ETS (European Trading Scheme), através do qual podem ser comercializadas reduções certificadas de emissões, dentro das especificações do Protocolo de Quioto e posteriores decisões tomadas em Conferência das Partes e também emissões provenientes de projetos de atividades os quais não atendam diretamente a todas as diretrizes estabelecidas pela Convenção do Clima.
Além do ETS existe a Chicago Climate Exchange (CCX), empresa americana que transaciona reduções de emissão de atividades de projeto que atendam aos critérios definidos pela empresa, os quais estão baseados tanto na Convenção quanto no Protocolo de Quioto, mesmo atuando num país não signatário do PQ. A CCX utiliza procedimentos diferentes do PQ, mas atinge os mesmos objetivos.
  • Deve-se destacar que, projetos que não se enquadram no Protocolo de Quioto, ou seja, são inelegíveis, mas são adicionais ou são desenvolvidos em países não signatários do Protocolo, podem ser avaliados em seus benefícios e inseridos também em outros tipos de mecanismos de mercados, ou até mesmo em ações de governança, os quais poderão atrair interesse multidirecionais de grupos econômicos diferenciados. Estas atividades tem sido vislumbradas em setores de marketing das empresas e corporações.
Os projetos que forem submetidos às regras do Protocolo de Quioto, têm a tonelada (tCO2eq) comercializada atualmente de 3 a 4 dólares. No mercado europeu, principal mercado de negociações de créditos atuais, a tonelada de carbono é negociada entre 15 a 30 euros (CARBONO BRASIL, 2006).
  • Nos EUA, são dedicados U$ 2.3 trilhões a investimentos socialmente responsáveis e os índices de ação para investimento sustentável se proliferam rapidamente. Fundos americanos são extremamente poderosos. Em virtude da pressão destes, as empresas se obrigam a terem transparência com a questão ambiental. 
Além disso, há o aumento da obrigação de transparência de política interna corporativa sobre a mudança climática e as questões de responsabilidade (ameaças de ações judiciais, resoluções de acionistas, responsabilidade da diretoria).

Outras Considerações:
  • Recentemente, o governo dos Estados Unidos da América anunciou que o orçamento anual para ações no contexto da mitigação de mudanças climáticas é da ordem de 3 bilhões de dólares (UNESCO,2006).
A Convenção do Clima, juntamente ao Protocolo de Quioto surgem como mecanismos facilitadores para a implantação de atividades de projeto ecologicamente mais eficientes, buscando a estabilização das emissões de GEE. O Brasil apresenta imensas oportunidades de negócios, as quais ainda estão sendo pouco exploradas.
  • Neste sentido pode-se dizer que o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo com a redução de emissão de gases de efeito estufa pode ser um grande aliado em relação à conservação da biodiversidade. Acontece que, a implementação da UNFCCC assim como do MDL está em seu início, gerando ainda várias discussões em cada COP realizada, mesmo assim muito pode e deverá ser feito em relação à mitigação de mudanças climáticas.
As instituições privadas e públicas precisam se preparar e prestar a devida atenção sobre este tema, observando que o ramo do mercado de carbono gera um futuro lucrativo para a economia, bem como para a questão ambiental, o ponto mais importante, dada a necessidade política e estratégias sustentáveis para o futuro da atual civilização.

Aquecimento Global, MDL e a Biodiversidade