domingo, 21 de agosto de 2016

Efeitos Nocivos da Poluição Derivada das Queimadas à Saúde Humana na Amazônia Brasileira

Efeitos Nocivos da Poluição Derivada das Queimadas 
à Saúde Humana na Amazônia Brasileira

Hermano Castro
Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca
Sandra Hacon
Fundação Oswaldo Cruz
Eliane Eignotti
Universidade Estadual de Mato Grosso
  • A população da região do arco do desmatamento da Amazônia brasileira sofre todos os anos com a poluição atmosférica derivada das queimadas durante o período de seca. Não é novidade que nessa época do ano a saúde, principalmente de crianças e idosos, sofra com a má qualidade do ar. 
Vários estudos apontam os efeitos da poluição atmosférica sobre a saúde humana nessa região. A queima de biomassa ocorre em maior extensão e intensidade na Amazônia Legal, situada ao norte do país. 
  • Segundo o inventário brasileiro de emissões de carbono, 74% das emissões ocorrem por meio de queimadas na Amazônia, em contraste com 23% de emissões do setor energético. A região da Amazônia Legal está passando por um processo acelerado de ocupação que, nas últimas três décadas, levou ao desmatamento de cerca de 10% de sua área. 
Essa região concentra mais de 85% das queimadas que ocorrem no Brasil durante o período de estiagem. A maior parte do desmatamento concentra-se ao longo de um “arco”, que abrange desde o sudeste do Maranhão, incluindo o norte do Tocantins, o sul do Pará, norte de Mato Grosso, Rondônia, sul do Amazonas, até o sudeste do Acre.
  • Concentra cerca de 524 municípios que, juntos, possuem uma população com mais de 10 milhões de habitantes. Os estados que registraram o maior número de queimadas em 2004 foram: Mato Grosso (38%), Pará (27%), Maranhão (10%) e Tocantins (7%). 
Nessa área, durante a estação seca, tipicamente compreendida entre os meses de junho a outubro, grande quantidade de focos de queimadas é detectada por satélites do Centro de Previsão do Tempo de Estudos Climáticos do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (CPTEC/INPE). 
  • As queimadas dessa região decorrem do modelo de ocupação e uso do solo, com o desmatamento de grandes áreas e, consequentemente, a queima da vegeta- ção, levando à liberação de gases e de material particulado. Diferente do que acontece nos centros urbanos, onde a poluição do ar se caracteriza por um processo de exposição crônica, na região da Amazônia Legal, se observa uma exposição aguda por um período relativamente curto de 3 a 5 meses.
As queimadas na Amazônia ocorrem essencialmente numa área definida como “arco do desmatamento”. Os níveis de poluição durante o período de seca, quando os focos de queimadas são mais frequentes, variam de ano para ano, havendo registros de níveis elevados de poluição nas duas últimas décadas. 
  • Ainda que os níveis de poluentes variem de um município para outro nessa região, sem dúvida, esses costumam apresentar picos mais elevados que as áreas de regiões metropolitanas do Brasil. Além disso, os efeitos da poluição atmosférica na Amazônia se relacionam fortemente com períodos de seca e chuva intensa na região. 
A legislação vigente do Conselho Nacional de Meio Ambiente não faz distinção quanto ao tamanho da partícula ou considerações a respeito das características da exposição por queima de biomassa na Amazônia (Conama,1990). 
  • Praticamente, durante toda a estação seca, nos municípios localizados na área do arco do desmatamento, os níveis de particulados finos (PM 2,5) permanecem acima do limite estabelecido como níveis médios diários aceitáveis pela Organização Mundial de Saúde de 25ìg/ m3 , sem distinção entre exposição aguda ou crônica, havendo registros de até 600ìg/m3 no final da década de 90 e de até 400 ìg/m3 nesta década. 
Por outro lado, durante as chuvas, os níveis de poluição atmosférica (PM 2,5) não excedem 15 ìg/m3 de média diária, e a composição do material particulado passa a ser exclusivamente biogênica, ou seja, formada por partículas emitidas pela própria floresta que incluem, grãos de pólen, fungos entre outros elementos (Pauliquevis et al., 2007). Essas partículas são muito leves e, em razão do calor e da direção dos ventos, são deslocadas para longas distâncias. 
  • A exposição humana às queimadas não necessariamente ocorre no local onde o foco da queima está presente, normalmente afastado da área urbana. As altas temperaturas envolvidas na fase de chamas da combustão e a ocorrência de circulações de ar, associadas às nuvens que favorecem o movimento convectivo ascendente da massa de ar, são responsáveis pela elevação dos poluentes gerados na queima de biomassa até a troposfera, onde estes podem ser transportados para regiões distantes das fontes emissoras. 
Este transporte de fumaça resulta em uma distribuição espacial dos poluentes sobre uma extensa área que irá influenciar a exposição humana através dos produtos de queima de biomassa, da quantidade de poluentes emitidos, da distância da população em relação à intensidade da queimada, das condições climáticas da região, da frequência da queima. Essas são algumas das razões que justificam a necessidade do monitoramento nos locais com maior aglomerado humano (Freitas et al., 2005). 

Efeitos Nocivos da Poluição Derivada das Queimadas 
à Saúde Humana na Amazônia Brasileira

  • As populações mais sensíveis, como idosos, crianças e grávidas sofrem os efeitos da poluição, e os residentes na área do arco do desmatamento têm sido expostos desde o nascimento aos níveis elevados de poluição atmosférica durante cerca de 3 a 4 meses a cada ano. 
Estudos mostram redução da capacidade pulmonar de crianças e adolescentes quando expostos ao material particulado fino, principalmente entre escolares não asmáticos (Viana et al., 2008). Verifica-se também um incremento percentual médio nas internações hospitalares e nas consultas em unidades básicas de saúde por doenças respiratórias de crianças e idosos (Carmo et al., 2009). 
  • Em alguns casos, quando ocorre poluição de PM 2,5 , que chegam frequentemente a 90 ìg/m3 , as internações podem aumentar em até 63% acima do que ocorreria na ausência deste poluente. As internações hospitalares de idosos por asma em toda a Amazônia brasileira apresentam distribuição espacial semelhante a do arco do desmatamento, ou seja, existe uma relação de aumento das internações nesta região geográfica da Amazônia, com predomínio durante o período de seca (Rodrigues et al., 2009). 
Para se ter uma ideia, estudos realizados nessa região mostraram uma prevalência de asma acima da média dos municípios brasileiros entre os escolares, com 21% de crianças asmáticas em Alta Floresta (Farias, 2009) e 26% em Tangará da Serra (Rosa et al., 2008). Estes percentuais são também mais elevados que os verificados em Cuiabá, Manaus e Belém em estudos prévios (Farias, 2009). 
  • Fica claro que os prejuízos decorrentes das queimadas precisam e devem ser dimensionados quanto ao custo social e ambiental. Os danos ambientais e para a saúde pública não se justificam pela queimada antropogênica, principalmente para a indução da produção agropecuária no Brasil. É necessária uma política que reduza substancialmente as queimadas na região amazônica visando à saúde e ao bem-estar das populações da Amazônia Legal. 

Referências Bibliográficas:

BRASIL. Ministério da Ciência e Tecnologia. Inventário Nacional de emissões de gases de efeito estufa. 2005. 
CARMO K. et al. Associação entre material particulado de queimadas e doenças respiratórias na região sul da Amazônia Brasileira. Pan American Journal of Public Health. Accepted to publish, 2009. 
CONAMA. Conselho Nacional de Meio Ambiente. Diário Oficial da União. Resolução n 003, 28 de jun. 1990. 
FARIAS M. C. Prevalência da asma e associação de fatores socioeconômicos no município de Alta Floresta, Amazônia brasileira, 2009. Dissertação de mestrado. Instituto de Saúde Coletiva. Universidade Federal de Mato Grosso. 
FREITAS, SR. et al. Monitoring the Transport of Biomass Burning Emissions in South America. Environ Fluid Mech, 5: 135–167, 2005. 
IGNOTTI, E. et al. Impacts of particulate matter (PM 2.5) emitted from biomass burning in the Amazon regarding hospital admissions by respiratory diseases: building up environmental indicators and a new methodological approach. Revista Saúde Pública. Aceito para publicação. 2009.
PAULIQUEVIS, T. et al. O papel das partículas de aerossol no funcionamento do ecossistema amazônico. Ciência e Cultura, 59(3): 48-50, 2007. 
PRODES - Programa de Desmatamento da Amazônia – Monitoramento da Floresta amazônica por satélite, INPE/ IBAMA; 200. 
RODRIGUES, P.C. et al. Distribuição espacial da asma em idosos na Amazônia brasileira. J Bras Pneumol, supl. 1R: R11, 2009.
ROSA, A.M. et al. Prevalência de asma em escolares e adolescentes em um município na região da Amazônia brasileira. J Bras Pneumol, 35(1): 7-13, 2009. 
VIANA, L. S. et al. Effect of air pollution on lung function in schoolchildren in Alta Floresta, Mato Grosso, Brazil. 2008. International Forum EcoHealth 2008. Conference Program International EcoHealth Forum. December 1st – 5th. Merida, Mexico, p. 86

Efeitos Nocivos da Poluição Derivada das Queimadas 
à Saúde Humana na Amazônia Brasileira