segunda-feira, 17 de outubro de 2016

Crescimento e Desenvolvimento econômico: A sustentabilidade como modelo alternativo

Crescimento e Desenvolvimento econômico:
A sustentabilidade como modelo alternativo

Edenis César de Oliveira
  • O presente artigo é resultado de um esforço teórico, a partir de pesquisa bibliográfica, no sentido de trazer alguma contribuição para o debate sobre o tema proposto. Longe da pretensão de apresentar conclusões, tampouco um conteúdo exaustivo, constitui-se, antes de qualquer coisa, na transcrição de algumas das principais idéias de destacados autores, no intuito de, minimamente, subsidiar o início de uma reflexão. 
Não raramente nos deparamos com artigos de jornais, revistas, artigos científicos, dissertações, teses, entre outros, discutindo um assunto tão em voga atualmente. Trata-se do tema crescimento econômico, ou simplesmente crescimento, mensurado através da explicitação de índices como Produto Interno Bruto - PIB, Produto Nacional Bruto – PNB, Renda Per Capita, entre outros. Sobre isso se faz oportuno observar o que diz o relatório da Unesco (1999, p. 28):
[...] o maior problema talvez surja do equilíbrio que automaticamente estabelece-se entre os níveis mais altos de produção – e por inferência, de consumo – e o desenvolvimento. A economia e todas as outras disciplinas reconhecem que, na melhor das hipóteses, trata-se de uma meia-verdade. O que é produzido e o fim que é dado ao produto tem igual importância no processo que a quantidade fabricada. Por outro lado, é evidente que o dólar que duplica a renda de uma pessoa pobre, cumpre papel diferente do dólar de acréscimo auferido por um milionário, para quem se trata de uma soma insignificante. Entretanto, em geral, equipara-se o desenvolvimento, quantificado em função de uma única medida técnica – habitualmente o PIB – com o progresso global da sociedade e do bem-estar. Faz parte da mentalidade do século XX, que considera que o meio é mais importante que o fim e o nível de atividade, mais importante do que os objetivos para os quais ela serve.
Franco (2000 apud Martinelli, 2004, p. 15) é enfático ao afirmar que:
[...] não se pode mais aceitar a crença economicista de que o crescimento do PIB representa tudo e vai resolver por si só todos os problemas econômicos e sociais do país.
O relatório da Unesco propõe como medidas para o desenvolvimento, o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), do PNUD, “que procura considerar as numerosas dimensões do bem-estar humano, já que a atenção concentrar-se-ia assim sobre os fins para os quais o desenvolvimento deve servir, em vez de fazê-lo apenas sobre os meios, por exemplo, para o aumento da produção” (UNESCO, 1999, p. 28-29). 
  • VEIGA (2005, p. 87) enfatiza o uso do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) uma vez que “as decisões políticas muitas vezes demandam uma medida sumária que incida mais claramente no bem-estar humano do que no rendimento”.
Na mesma citação considera ainda que:
"O PNUD admite que o IDH é um ponto de partida. Recorda que o processo de desenvolvimento é muito mais amplo e mais complexo do que qualquer medida sumária conseguiria captar, mesmo quando completada com outros índices. [...] O IDH não é uma medida compreensiva, pois não inclui, por exemplo, a capacidade de participar nas decisões que afetam a vida das pessoas e gozar do respeito dos outros na comunidade. [...] uma pessoa pode ser rica, saudável e muito instruída, mas sem essa capacidade o desenvolvimento é retardado (VEIGA, 2005, p. 87).
Corroborando o pensamento de Veiga, Besserman (2005, p. 103) acrescenta que “todo indicador, entretanto, tem grandes limitações. O IDH deixa de considerar muitas variáveis importantes e combinam medidas que podem mudar rápido (freqüência à escola, renda per capita) com medidas que exigem mais tempo para mudar (analfabetismo, esperança de vida)”. 
  • Por este motivo, acredita ele, “muitas vezes o IDH é severamente criticado”. 
O fato do desentendimento ou simplesmente não consenso sobre o conceito de desenvolvimento, seu significado e como pode ser mensurado, constitui-se como um dos fatores do agravamento da situação da vida no planeta. Gadotti (2000, p. 33) transcrevendo citação do Relatório da Conferência Internacional sobre Meio Ambiente e Sociedade: Educação e Conscientização Pública para a Sustentabilidade, organizada pela Unesco e realizada na Tessalônica, Grécia, em dezembro de 1997, faz o seguinte apontamento:
"[...] destaca entre outros os seguintes fatores do agravamento da situação da vida no planeta: a) o rápido crescimento da população mundial e a mudança na distribuição; b) a persistência da pobreza generalizada; c) as crescentes pressões sobre o meio ambiente devido à expansão da indústria em todo o mundo e o uso de modalidades de cultivos novos e mais intensivos; d) a negação contínua da democracia, as violações dos direitos humanos e o aumento de conflitos e de violência étnica e religiosa, assim como a desigualdade entre homens e mulheres; e) o próprio conceito de desenvolvimento, o que significa e como é medido (UNESCO, 1999, p. 23). - grifo nosso.
Os referidos textos, muitos deles, escritos por autores de reconhecida competência, se limitam a apontar “receitas” de crescimento, não fazendo, às vezes, distinção entre crescimento e desenvolvimento econômico. Sobre isso já nos alertava Celso Furtado (FURTADO, 1974 apud VEIGA, 2005) ao afirmar que:
"[...] a idéia de desenvolvimento econômico é um simples mito. Graças a essa idéia, diz ele, tem sido possível desviar as atenções da tarefa básica de identificação das necessidades fundamentais da coletividade e das possibilidades que abre ao homem o avanço da ciência, para concentrá-lo em objetivos abstratos, como são os investimentos, as exportações e o crescimento.
Rivero (2002), discutindo especificamente a atuação política dos governos, evidencia esta superficialidade quando diz que:
"[...] o crescente desequilíbrio físico-social (*) entre abastecimento de alimento, energia e água e população urbana equivale a uma falha sísmica de natureza sócio-política, que pode causar tremores de desintegração nacional. [...] A maioria dos governos mostra absoluta despreocupação quanto ao crescimento urbano e à disponibilidade futura de água, energia e alimentos. O mito do desenvolvimento está tão enraizado no inconsciente coletivo das classes políticas que elas não se preocupam com o desequilíbrio físico-social. Parecem acreditar que o desenvolvimento é possível sem água, sem energia e sem alimentos, bastando aplicar a política econômica e financeira que prescrevem as grandes potências, as transnacionais e as instituições econômicas e financeiras internacionais (p. 214).
(*) Segundo o autor, há uma nítida tendência mundial de escassez e encarecimento dos alimentos, da água e da energia, que contrasta com o crescimento da população urbana em muitos países pobres. 
Não é necessária uma investigação profunda para se dar conta do verdadeiro paradoxo no qual se inicia o século XXI: de um lado o crescimento econômico e as transformações tecnológicas sem precedentes, por outro, a dramática condição social de uma grande maioria de pessoas, além de problemas ambientais graves. 
  • Não obstante, disseminou-se pelo planeta inteiro a imagem de um estilo de vida ocidental de alto consumo, conforto material e permanente entretenimento. Sem embargo, esta disseminação cultural não tem sido acompanhada com a mesma intensidade pela difusão global dos valores democráticos e do respeito aos direitos humanos, que são a própria substância da civilização ocidental. Hoje o conforto capitalista pode conviver com a barbárie. [...] 
O desenvolvimento da ciência e da tecnologia, não vem acompanhado do desenvolvimento de uma consciência ética que coloque a humanidade como prioridade (RIVERO, 2002). 
  • O cenário está posto: de um lado, globalização provocada pelo vertiginoso avanço tecnológico, tendo como corolário a internacionalização da produção e expansão dos fluxos financeiros (isenção total de barreiras para o fluxo do capital); regionalização caracterizada pela formação de blocos econômicos; fragmentação dividindo globalizadores e globalizados, centro e periferia, os que morrem de fome e os que morrem pelo consumo excessivo de alimentos, rivalidades regionais, confrontos políticos, étnicos, terrorismo, além de outras dicotomias (GADOTTI, 2000).
Ainda de acordo com esta linha de pensamento, Cadernos do Desenvolvimento (2006, p. 55-56) enfatiza que:
"Se o neoliberalismo cria tanta resistência, desalento, angústia, insegurança, é porque não é simplesmente uma política econômica. É um instrumento sociocultural através do qual se busca substituir um tipo de sociedade – que procurava certo equilíbrio entre eficiência econômica e solidariedade social, e que havia se logrado construir em alguma medida no pós-guerra – por outra na qual se exacerbam a eficiência, a competitividade e o individualismo, se privilegia tudo o que é privado às expensas do que é público, com uma grande concentração de riqueza e poder, procurando anular toda capacidade de se contrapor a esses efeitos."
Fica evidente, portanto, a total despreocupação com a harmonização entre resultados econômicos satisfatórios e qualidade de vida social, como forma alternativa à marginalização das necessidades humanas em detrimento do avanço tecnológico e índices financeiros “satisfatórios”, matéria-prima do capital especulativo e improdutivo. 
  • O modelo hegemônico de desenvolvimento capitalista globalizado, que reduz o desenvolvimento humano ao crescimento econômico, polariza o poder e os recursos, fomentando desigualdades de toda ordem, consequentemente, destruindo o meio ambiente (GADOTTI, 2000). Para um dos notáveis nomes no debate, o economista Ignacy Sachs, o crescimento não traz, automaticamente, o desenvolvimento, tampouco a felicidade (SACHS, 2001). 
Sachs avança em suas afirmações ao chamar a atenção para o fato de que uma situação mais comum é a do crescimento pela desigualdade, com efeitos sociais perversos: a acumulação de riqueza nas mãos de uma minoria, com a simultânea produção de pobreza maciça e deterioração das condições de vida. Nos casos extremos, afirma Sachs, estamos na presença de crescimento com des-desenvolvimento. José Eli da Veiga vai além ao apresentar o pensamento de Sachs, defendendo a idéia de que: 
"[...] o desenvolvimento pode permitir que cada indivíduo revele suas capacidades, seus talentos e sua imaginação na busca da autorealização e da felicidade, mediante esforços coletivos e individuais, combinação de trabalho autônomo e heterônomo e de tempo gasto em atividades não econômicas. [...] Maneiras viáveis de produzir meios de vida não podem depender de esforços excessivos e extenuantes por parte de seus produtores, de empregos mal remunerados exercidos em condições insalubres, da prestação inadequada de serviços públicos e de padrões subumanos de moradia (VEIGA, 2005, p. 80-81).
Segundo Vecchiatti (2004, p. 90) “uma das conclusões óbvias que pode ser extraída desse quadro de contrastes é que o crescimento econômico, por si só, não traz automaticamente o desenvolvimento. Na prática, a equação que relaciona crescimento e desenvolvimento, ainda não está com suas variáveis equilibradas; ela ainda desafia os economistas questionando se o desenvolvimento socialmente justo e ambientalmente sustentável estaria realmente na contramão do crescimento econômico”. É cabível a contribuição de Sachs (2001, p. 157-158) ao enfatizar:
  • "Por outro lado, o fato de que o desenvolvimento não está contido no crescimento econômico não deve ser interpretado em termos de uma oposição entre crescimento e desenvolvimento. O crescimento econômico, se repensado de forma adequada, de modo a minimizar os impactos ambientais negativos, e colocado a serviço de objetivos socialmente desejáveis, continua sendo uma condição necessária para o desenvolvimento. [...] Precisamos de taxas mais altas de crescimento econômico para acelerar a reabilitação social, uma vez que é mais fácil operar nos acréscimos do PNB que distribuir bens e rendas numa economia estagnada.
Em seu discurso, registrado em Cadernos do Desenvolvimento (2006), professor economista Arturo Guillén, coordenador da Rede Eurolatinoamericana de Estudos para o Desenvolvimento acrescenta:
"La acumulación y el progreso técnico son parte integrante del desarrollo desde el momento em que el crecimiento es su base material. Pero el crecimiento es solamente um prerrequisito del desarrollo, nol el desarrollo em si. [...] El desarrollo no podia ser el resultado espontáneo de la acción de las leyes de mercado, sino que era um proceso de transformación de estructuras, lo que implicaba la creación de uma estructura productiva, vale decir de um sistema productivo, que assegurara um desarrollo endógeno autosustentable (p. 122). 
Dessa forma, convencemo-nos de que estamos diante de uma propositura que extrapola a simples diferenciação semântica. De que forma se poderia pensar o desenvolvimento na sua complexidade, sem, no entanto, incorrer no erro de adotar uma linha teórica que, inevitavelmente, se mostrará limitada e distorcida? 
  • Como seres pensantes, dotados de racionalidade e, formadores de opinião, devemos utilizar disso para dar consistência ao nosso posicionamento, quiçá assim, contribuir para uma sociedade mais justa, humana e includente.

Crescimento e Desenvolvimento econômico:
A sustentabilidade como modelo alternativo

Subdesenvolvimento: Pré-Fase do Desenvolvimento?
  • Já nos anos 1960, Celso Furtado enfatizava a necessidade de ruptura com a idéia de que subdesenvolvimento era um estágio do desenvolvimento. Pelo contrário, subdesenvolvimento era uma condição que poderia perpetuar, ou prolongar por muitos séculos, como condição precária enraizada nas nações. 
A assertiva é confirmada por Furtado quando diz que “o subdesenvolvimento é um processo histórico autônomo e não uma etapa pela qual tenham necessariamente passado as economias que já alcançaram o grau superior de desenvolvimento” (FURTADO, 1961). 
  • Nessa formulação, ele chamava a atenção para o desafio de construir forças políticas, econômicas e sociais, além de intelectuais, capazes de romper as estruturas que vinham do passado colonial, escravista, de dependência, a fim de promover o desenvolvimento dos países subdesenvolvidos. 
Ainda nesta perspectiva, a citação de Manuel Alcino Ribeiro da Fonseca, em obra recém lançada complementa
"[...] o desenvolvimento econômico é um processo relativamente recente, pois coincide com o aparecimento do capitalismo e, mais propriamente, com o advento da Revolução Industrial. De modo geral, os sistemas pré-capitalistas eram marcados pela estagnação econômica, uma vez que não existiam acumulação nem crescimento da produção (basicamente agrícola) – ou seja, não existia desenvolvimento. Portanto, “o subdesenvolvimento tem sido o estado normal das sociedades humanas”. 6 (FONSECA, 2006, p. 4-5). – grifo nosso. 
O caráter elucidativo da citação em destaque nos remete a refletir sobre nossa real e atual situação nesse cenário. O Brasil, assim como outros países da América Latina, apresenta todas as características e pré-requisitos para permanecer classificado nessa categoria de “estado normal”, o chamado subdesenvolvimento, agora denominado e classificado como “emergente”. Sobre a natureza do desenvolvimento Furtado afirma peremptoriamente:
"O desenvolvimento não é apenas um processo de acumulação, de aumento de produtividade macroeconômica, mas principalmente o caminho de acesso às formas sociais mais aptas a estimular a criatividade humana e responder às aspirações da coletividade. Dispor de recursos para investir está longe de ser condição suficiente para preparar um futuro melhor para a massa da população. Mas quando o projeto social prioriza e efetiva a melhoria das condições de vida desta população, o crescimento se metamorfoseia em desenvolvimento. Ora, essa metamorfose não se dá espontaneamente. Ela é fruto da realização de um projeto, expressão de uma vontade política. As estruturas de países que lideram o processo de desenvolvimento econômico e social não resultaram de uma evolução inercial, mas de uma opção política orientada para formar uma sociedade apta a assumir um papel dinâmico nesse processo (FURTADO, 1961 apud Cadernos do Desenvolvimento, 2006, p. 25). 
Evidencia-se o que já afirmamos anteriormente, o fato de que o crescimento é uma condição necessária, porém insuficiente para o pleno desenvolvimento. Por conseguinte, o pleno desenvolvimento deve, necessariamente, representar, a melhoria substancial das condições de vida da população. 
  • O então senador e economista Aloísio Mercadante em sua fala no Seminário Internacional: A atualidade do pensamento de Celso Furtado sobre o desenvolvimento, ocorrido no auditório do Senado Federal em Brasília, nos dias 24 e 25 de novembro de 2005, é categórico ao afirmar que “o ponto de partida do processo de reconstrução deverá ser uma participação maior do povo no sistema de decisões. 
Sem isso o desenvolvimento futuro não se alimentará da autêntica criatividade e pouco contribuirá para a satisfação dos anseios legítimos da nação” (CADERNOS DE DESENVOLVIMENTO, 2006, p. 26). 
  • Resta saber como a sociedade, de fato, poderá participar efetivamente desse sistema de tomada de decisões. Seria o sufrágio uma das maneiras democráticas de participação da sociedade ao se deparar com a responsabilidade de decidir, a cada quadriênio, quem a representará nas instâncias do poder? Esta seja uma das maneiras, senão a mais democrática e popular, conquistada desde as “Diretas Já”, porém, limitada e insuficiente diante da atual demanda. 
Preferimos nos ater às palavras de Celso Furtado quando diz:
"A nós, cientistas sociais, caberá a responsabilidade de velar para que não se repitam os erros do passado, ou melhor, para que não voltem a ser adotadas falsas políticas de desenvolvimento, cujos benefícios se concentram na mão de poucos. Quando o consenso se impõe a uma sociedade, é porque ela atravessa uma era pouco criativa. Ao se afastar do consenso, o jovem economista perceberá que os caminhos já trilhados por outros são de pouca valia. Logo notará que imaginação é um instrumento de trabalho poderoso e que deve ser cultivada. Perderá em pouco tempo a reverência do que está estabelecido e compendiado e, à medida que pensar por conta própria, com independência, conquistará a autoconfiança e perderá a perplexidade (FURTADO, 1983 apud CADERNOS DE DESENVOLVIMENTO, 2006, p. 27). 
De acordo com Gadotti (2000, p. 58) “[...] a expressão “desenvolvimento humano” tem a vantagem de situar o ser humano no centro do desenvolvimento. O conceito de desenvolvimento humano, cujos eixos centrais são “eqüidade” e “participação”, está ainda em evolução, e se opõe à concepção neoliberal de desenvolvimento. 
  • Concebe a sociedade desenvolvida como uma sociedade eqüitativa, possível somente pela participação das pessoas”. 
O Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento – PNUD a partir de uma definição concisa inclui as pessoas como atores principais nesse processo, como pode ser observado na citação feita por José Eli da Veiga:
"[...] O desenvolvimento tem a ver, primeiro e acima de tudo, com a possibilidade de as pessoas viverem o tipo de vida que escolheram, e com a provisão dos instrumentos e das oportunidades para fazerem as suas escolhas. [...] essa é uma idéia tão política quanto econômica. Vai desde a proteção dos direitos humanos até o aprofundamento da democracia (VEIGA, 2005, p. 801).
Segundo Gadotti (2000, p. 58) “[...] o conceito de desenvolvimento humano é muito amplo e, por vezes, ainda vago. As Nações Unidas, nos últimos anos, passaram a usar a expressão “desenvolvimento humano” como indicador de qualidade de vida fundados nos índices de saúde, longevidade, maturidade psicológica, educação, ambiente limpo, espírito comunitário e lazer criativo”. Ainda sobre o IDH, Veiga é contundente ao afirmar que:
" O principal defeito do IDH é que ele resulta da média aritmética dos três índices mais específicos que captam renda, escolaridade e longevidade. Mesmo que se considere inevitável a ausência de outras dimensões do desenvolvimento par as quais ainda não há disponibilidade de indicadores tão cômodos – como a ambiental, a cívica ou a cultural -, é duvidoso que seja essa média aritmética a que melhor revele o grau de desenvolvimento atingido por uma determinada coletividade. [...] é mais razoável supor que o cerne da questão esteja justamente no possível descompasso entre o nível de renda obtido por determinada comunidade e o padrão social que conseguiu atingir, mesmo que revelado apenas pela escolaridade e longevidade (2005, p. 88).
De qualquer forma e, apesar de suas limitações, o IDH apresenta-se como um avanço na questão da tentativa de mensurar o desenvolvimento a partir de uma perspectiva mais humana e social. Como se não bastasse, evidencia também certa insatisfação em relação ao método limitado que vinha sendo proposto e até então aceito. VEIGA (2005, p. 100) complementa sua abordagem corroborando o esforço de sistematização acima proposto quando afirma:
[...] o desenvolvimento pode ser medido e comparado a uma dada configuração projetada, mediante cada um dos indicadores e de seu conjunto. Ou seja, em vez de um duvidoso índice sintético, que pretenda expressar em um único número a complexidade do desenvolvimento, é preferível ter um conjunto integrado de indicadores
A Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, reunida em Estocolmo em junho de 1972, e atenta à necessidade de um critério e de princípios comuns que ofereçam aos povos do mundo inspiração e guia para preservar o meio ambiente humano, proclama que (Declaração nº. 1):
"O homem é, a um tempo, resultado e artífice do meio que o circunda, o qual lhe dá o sustento material e o brinda com a oportunidade de desenvolver-se [...] intelectual, moral, social e espiritualmente (BRUNACCI; PHILIPPI JR., 2005, p. 260)
A sustentabilidade como um novo paradigma de Desenvolvimento:
  • A partir do entendimento de que o homem está intrinsecamente ligado ao meio e dele não pode ser separado, e ainda, que os seres humanos constituem o centro e a razão do processo de desenvolvimento, significa advogar um novo estilo de desenvolvimento que seja ambientalmente sustentável no acesso e no uso dos recursos naturais e na preservação da biodiversidade; socialmente sustentável na redução da pobreza e das desigualdades sociais e promotor da justiça e da eqüidade; culturalmente sustentável na conservação do sistema de valores, práticas e símbolos de identidade; politicamente sustentável ao aprofundar a democracia e garantir o acesso e a participação de todos nas decisões de ordem pública (GUIMARÃES8 , 2001, p. 55). 
A concepção de desenvolvimento sustentável tem suas raízes fixadas na Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, realizada em Estocolmo, capital da Suécia, em junho de 1972. A condição de escassez e esgotabilidade dos recursos naturais face ao modelo de desenvolvimento econômico dos países hegemônicos foi o grande precursor desta conferência que mobilizou vários países numa discussão que ainda permeia as agendas governamentais. 
  • Esta conferência resultou em uma declaração que conclamou a junção de esforços de todos os governos e povos com o objetivo precípuo de preservar e melhorar o meio ambiente em benefício de toda humanidade e sua posteridade. Por conseguinte, chegou-se à conclusão de que era urgente a necessidade de se redefinir o próprio conceito de desenvolvimento, dada a complexidade das questões envolvidas. 
BRUNACCI e PHILIPPI Jr. (2005) enfatizam que: 
"Tal ênfase na defesa do meio ambiente humano, perante a questão ambiental do modelo de desenvolvimento de cunho predatório, foi resultado de um despertar da consciência ecológica em nível global, que buscou ir além das questões de âmbito local ou regional, as quais, nas décadas de 1950 e de 1960, já incomodavam as agências estatais de controle ambiental das nações industrializadas e incrementavam as atividades dos movimentos ambientalistas.
O termo sustentabilidade ecoa polissêmico. Sem embargo, “em que pese a variedade de interpretações existentes na literatura e no discurso político acerca da sustentabilidade, a definição que se adotou internacionalmente foi a da Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento - CNUMAD (BRUNDTLAND , 1987), qual seja, o desenvolvimento sustentável é aquele que satisfaz as necessidades das gerações atuais sem comprometer a capacidade das gerações futuras de satisfazer suas próprias necessidades” (GUIMARÃES, 2001, p. 55). No relatório da Comissão Interministerial brasileira para a Conferência do Rio de Janeiro, publicado em dezembro de 1991 intitulado O desafio do desenvolvimento sustentável, registra-se que:
"O desenvolvimento sustentável seria atingido pela retomada do crescimento e melhor distribuição de seus benefícios e pela racionalização do uso de energia; o atendimento das necessidades básicas das populações, pela estabilização dos níveis demográficos; a conservação da base de recursos, pela reorientação da tecnologia no sentido da redução de seu impacto ecológico e a incorporação de critérios ambientais nas decisões econômicas (CIMA, 1991, p. 182). 
Transcorridos vinte anos após a realização da Conferência em Estocolmo, a Organização das Nações Unidas promoveu no Rio de Janeiro um novo encontro internacional, a Conferência da Organização das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, que ficou conhecida como Eco-92 ou, simplesmente Rio-92, com objetivo de avaliar como os países haviam articulado o processo de proteção ambiental desde o encontro anterior e, ainda discutir novas propostas para algumas questões específicas sobre mudanças climáticas, a proteção da biodiversidade, entre outras. 
  • O evento obteve grande amplitude, contando com a presença de representantes de 178 países, além da participação maciça da sociedade civil, “lançando as bases sobre as quais os diversos países do mundo deveriam, a partir daquela data, empreender ações concretas para a melhoria das condições sociais e ambientais, tanto no âmbito local quanto planetário”.  
Não obstante a sua importância, a Rio-92 sofreu algumas críticas, mormente no que se refere à questões estruturais dos problemas ambientais – o capitalismo, o modelo de desenvolvimento econômico dos países, os valores sociais, as relações de poder entre os países – não terem sido discutidas em profundidade. Nesse sentido, Carvalho, Moura e Costa apud Pelicioni, (2004, p. 450) chamam a atenção para 
"o caráter conservador/retrógrado [do evento] ao omitir, de sua pauta, qualquer crítica efetiva à totalidade pertinente à questão: os sistema capitalista mundial. Portanto, as estratégias desenhadas na Eco-92 têm suas limitações no próprio sistema vigente, uma vez que não enfrentam as contradições da totalidade pertinente à questão. Somente enfrentando estas contradições pode-se enfrentar a questão ambiental numa abordagem transformadora/progressista.
Ainda sob este prisma Foladori (2001) acrescenta:
"No fim das contas, nas duas conferências de países em âmbito mundial e no informe encomendado, fica claro que a preocupação manifesta se dá em torno de como reduzir os níveis de poluição, de depredação e de pobreza e superpopulação, sem tocar na forma social de produção, ou seja, no capitalismo. Em que medida essas melhorias, que vão, aparentemente, contra a lógica da própria dinâmica capitalista, conseguem ser suficientemente eficazes é algo que somente dentro de algumas décadas poderemos saber (p. 119).
A despeito das críticas, o Encontro aprovou um dos documentos mais importantes: A Agenda 21. Novaes (2005, p. 324) afirma:
"[...] o documento tratava de praticamente todas as grandes questões, dos padrões de produção e consumo à luta para erradicar a pobreza no mundo e às políticas de desenvolvimento sustentável – passando por questões como dinâmica demográfica, proteção à saúde, uso da terra, saneamento básico, energia e transportes sustentáveis, eficiência energética, poluição urbana, proteção a grupos desfavorecidos, transferência de tecnologias dos países ricos para os pobres, habitação, uso da terra, resíduos (lixo) e muito mais. 
O referido documento transcende o caráter normativo, uma vez que não obriga as nações signatárias, mas é um documento ético que se reduz a um compromisso por parte destes países. Não é um documento técnico, mas político. [...] 
  • Ela tem se constituído muito mais numa agenda da sociedade do que dos Estados. [...] A essência fundamental da Agenda 21 é que esse documento foi negociado previamente e pactuado entre as nações, mudando a forma como o tema era tratado até então. Transformou-se num documento estratégico abrangente (Gadotti, 2000, p. 110-11). 
A Agenda 21 ampliou o conceito de desenvolvimento sustentável, eficiência econômica e equilíbrio ambiental, [...] indicando as ferramentas de gerenciamento necessárias (Kohler e Philippi Jr., 2005, p. 716)14 Com a finalidade de tornar esta ferramenta de gestão mais próxima das comunidades locais, foi proposto um desdobramento que resultou na elaboração da Agenda 21 Local. 
  • De acordo com Foladori (2000, p. 113) a Agenda 21 foi definida como “um processo participativo, multissetorial, para alcançar os objetivos da Agenda 21 no nível local, através da preparação e implementação de um plano de ação estratégico, de longo prazo, dirigido às questões prioritárias para o desenvolvimento sustentável local”. 
A importância do nível local pode ser justificada quando se constata que são nas cidades onde se manifestam mais claramente os problemas que afetam a qualidade de vida da população, além do que, é nas capilaridades onde se observa maior sensibilidade (Kohler e Philippi Jr. 2005).  
  • É importante lembrar que a Agenda 21, seja em qual nível for – Internacional, Nacional, Regional ou Local, representa, como já foi dito anteriormente, uma importante ferramenta, porém, necessita, como todo instrumento de trabalho, de operacionalizadores, de executores, enfim daqueles que manusearão tais ferramentas. 
Neste sentido, retoma-se a importância da participação da comunidade, representada por sociedades civis, além de envolver todos os interessados na discussão, elaboração e implementação seguida pela avaliação de todo o processo. 
  • Trata-se, portanto, de um processo que não pode e não deve ser interrompido, uma vez que a etapa final de uma ação apresenta-se totalmente interligada na etapa seguinte, constituindo um verdadeiro processo de imbricação. 
Conclusão:
  • O desenvolvimento deve ser visto na sua forma mais ampla possível, a partir do atendimento mínimo das necessidades básicas da população, uma vez que “o desenvolvimento só poderá ser considerado efetivo [...] se este constituir-se em desenvolvimento humano, social e sustentável, pois, quando se fala em desenvolvimento, deve-se estar buscando a melhoria da vida das pessoas [...] e da sociedade como um todo” (Martinelli, 2004, p. 14). 
Faz-se necessário aumentar o acesso da população às instâncias decisórias, ou seja, à participação efetiva nas tomadas de decisões nas esferas públicas, além de viabilizar seu acesso à riqueza gerada pelo país, através de uma política de distribuição de renda mais justa e igualitária. 
  • Permitir, também, a possibilidade do acesso ao conhecimento desenvolvido (popularização do conhecimento) através de política pública educacional que possibilite ao cidadão, desde cedo, ter uma visão crítica. Isso só será possível quando a atenção dos governantes não estiver voltada para índices meramente quantitativos, sem levar em consideração o aspecto qualitativo, base de todo processo. 
De acordo com Leff (2001, p. 64) “[...] estas mudanças não serão alcançadas sem uma complexa estratégia política, orientada pelos princípios de uma gestão democrática do desenvolvimento sustentável, mobilizada pelas reformas do Estado e pelo fortalecimento das organizações da sociedade civil”. 
  • Parafraseando Martinelli (2004) diríamos que somente desta forma estaríamos caminhando efetivamente para a promoção de um desenvolvimento efetivo e extensivo a toda população. Não há receita de bolo, tampouco fórmulas mágicas. Entretanto, urge desapegarmos de velhas e enraizadas concepções que até hoje não contribuíram para um avanço significativo em termos de desenvolvimento. Como diria Tito Lívio: “É preciso ousar, ou resignar-se a tudo”.
Referências Bibliográficas: 

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Crescimento e Desenvolvimento econômico:
A sustentabilidade como modelo alternativo