sexta-feira, 14 de outubro de 2016

O Desenvolvimento Sustentável da agricultura no cerrado brasileiro

O Desenvolvimento Sustentável da agricultura no cerrado brasileiro

Rodrigo Pedrosa Marquelli
O Conceito de Sustentabilidade:
  • A palavra sustentabilidade tem forte conotação valorativa: reflete mais uma expressão dos desejos e valores de quem a exprime do que algo concreto, de aceitação geral. Por isso mesmo, as definições correntes de desenvolvimento sustentável são vagas e amplas o suficiente para poder encampar o máximo de condições que se possa requerer do processo de desenvolvimento. 
No confronto com a opção de crescer e no processo de impor inevitável desgaste ao estoque de recursos naturais, ou conservar o meio ambiente, o crescimento sustentável provê os dois: crescimento com conservação; e assim se qualifica como um objetivo social eticamente legítimo. 
  • Em meados da década de 80, os impactos da agricultura moderna, a destruição das florestas tropicais, as chuvas ácidas, a destruição da camada atmosférica de ozônio, o aquecimento global e o “efeito estufa” tornavam-se temas familiares para grande parte da opinião pública, principalmente, nos países ricos. 
Questionava-se até que ponto os recursos naturais suportariam o ritmo de crescimento econômico imprimido pelo industrialismo ou mesmo se a própria humanidade resistiria às seqüelas do chamado “desenvolvimento”.
  • Consolidava-se um novo paradigma, um novo ideal: a sustentabilidade. Em 1987, a Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento publicava: Nosso Futuro Comum, o famoso Relatório Brundtland, que ajudou a disseminar o ideal de um desenvolvimento sustentável para diferentes setores das sociedades modernas, como a agricultura e a economia. 
O conceito de desenvolvimento sustentável da Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, publicado no ano de 1987: "O desenvolvimento sustentável é aquele que satisfaz as necessidades da geração presente sem comprometer as possibilidades das gerações futuras em satisfazer as suas necessidades". A partir daí, outros conceitos foram surgindo.
“Desenvolvimento sustentável é uma estratégia de desenvolvimento que administra todos os ativos, os recursos naturais e os recursos humanos assim como os ativos financeiros e físicos de forma compatível com o crescimento da riqueza e do bem-estar em longo prazo. O desenvolvimento sustentável, como um ideal, rejeita políticas e práticas que dêem suporte aos padrões de vida correntes à custa da deterioração da base produtiva, inclusive a de recursos naturais, e que diminuam as possibilidades de sobrevivência das gerações futuras”. (Repetto, 1986, p. 15).
“A sustentabilidade da agricultura e dos recursos naturais se refere ao uso dos recursos biofísicos, econômicos e sociais segundo sua capacidade, em um espaço geográfico, para, mediante tecnologias biofísicas, econômicas, sociais e institucionais, obter bens e serviços diretos e indiretos da agricultura e dos recursos naturais para satisfazer as necessidades das gerações presentes e futuras. O valor presente dos bens e serviços deve representar mais que o valor das externalidades e dos insumos incorporados, melhorando ou pelo menos mantendo de forma indefinida a produtividade futura do ambiente biofísico e social. Além do mais, o valor presente deve estar equitativamente distribuído entre os participantes do processo” (IICA/GTZ, 1992, p. 29-30)
Identificam-se nesses conceitos as seguintes condições a que o desenvolvimento sustentável deveria, idealmente, atender: incremento da qualidade de vida, maior controle dos processos biológicos pela própria agricultura, uso mais eficiente dos recursos naturais pela agricultura, aumento da produção a custos marginais não-ascendentes, e aumento do nível de bem-estar de uma geração sem o sacrifício do bem-estar de qualquer outra geração. 
  • Segundo Cunha (1994), dentro do conceito de desenvolvimento sustentável, quatro aspectos estão relacionados entre si: a eficiência técnica, a sustentabilidade econômica, a estabilidade social e a coerência ecológica. A dimensão técnica tem a ver com o incremento da produtividade dos recursos naturais, indispensável para compatibilizar a conservação da natureza com aumento da produção. 
Uma avaliação da sustentabilidade da agricultura nos cerrados requer a análise de alguns problemas: o comportamento dos rendimentos físicos da terra, as possibilidades da produtividade da terra, as possibilidades oferecidas pela tecnologia para reparar danos e a capacidade das instituições de pesquisa de responder aos desafios da sustentabilidade. 
  • O crescimento da agricultura somente será sustentável se puder crescer a custos não-ascendentes, sendo a capacidade da tecnologia de afastar o espectro dos rendimentos decrescentes, sejam aqueles decorrentes da intensificação da exploração sobre uma base fixa de recursos naturais, ou os que poderão vir degradar a base de recursos. 
A agricultura nos cerrados somente será sustentável se for capaz de competir com aquela de outras regiões e mesmo com a de outros países. A evidência disponível até agora é de que o cerrado goza de vantagens comparativas na produção agrícola. 
  • A estabilidade social é outra dimensão da sustentabilidade do desenvolvimento, aspecto importante quando se analisa uma região de expansão da fronteira agrícola como é o caso dos cerrados. É preciso reconhecer o processo de ocupação do cerrado, verificar como a agricultura tem-se estruturado na região e até que ponto ela já se encontra consolidada. 
A coerência ecológica é a intensidade que a exploração seja compatível com a capacidade de suporte do meio ambiente. A região de cerrados é muito heterogênea, com ecossistemas estáveis e resistentes e sistemas extremamente sensíveis à ação antrópica. 
  • A intensidade da exploração também varia com o uso dos recursos naturais, exercendo menor pressão (ex.: extrativismo vegetal, florestas cultivadas, pastagens naturais) ou mais agressoras ao meio ambiente (ex.: lavouras intensamente mecanizadas). Diante da disponibilidade de terras aptas para o cultivo e pressão da demanda por alimentos, é inevitável a continuidade da expansão da agricultura.
A Sustentabilidade da Agricultura:
  • O aumento das preocupações quanto à qualidade de vida e aos problemas ambientais ocorreu no meio da década de 80. O Relatório Brundtland lançou à humanidade o desafio do “desenvolvimento sustentável”, sendo que no final da década de 80, o conceito de desenvolvimento sustentável tornava-se uma espécie de ideal da sociedade contemporânea. 
No setor agropecuário, o significado “sustentável” passou a atrair a atenção de um maior número de profissionais. Desde o final dos anos 80 proliferaram as tentativas de definir o que é a agricultura sustentável, indicando o desejo de um novo padrão produtivo que garanta a segurança alimentar sem agredir o ambiente. Houve nesse momento, uma insatisfação com a chamada agricultura “convencional” ou “moderna”. 
  • A agricultura teve início há mais ou menos dez mil anos, quando alguns povos do norte da África e do oeste asiático abandonaram progressivamente a caça e a coleta de alimentos e começaram a produzir seus próprios grãos. Mas, apesar da experiência milenar, o domínio sobre as técnicas de produção era, em geral, muito precário e a produção de alimentos sempre foi um dos maiores desafios da humanidade. 
A fome matou centenas de milhares de pessoas em todo o mundo durante toda a Antiguidade, a Idade Média e a Renascença. A agricultura moderna nasceu durante os séculos XVIII e XIX em diversas áreas da Europa. Um intenso processo de mudanças tecnológicas, sociais e econômicas, que hoje é chamada de Revolução Agrícola, teve papel crucial na decomposição do feudalismo e no advento do capitalismo. 
  • Tornando-se atividades cada vez mais complementares, o cultivo e a criação de animais formaram progressivamente os alicerces das sociedades européias. O que, segundo Veiga (1991), provocou um dos mais importantes saltos de qualidade da civilização humana: o fim da escassez crônica de alimentos. 
A base da produção agrícola permaneceu praticamente inalterada durante a segunda metade do século XIX, quando a agricultura continuava a empregar a força animal e o setor manufatureiro utilizava máquinas a vapor como força energética. 
  • A força animal foi paulatinamente substituída por tratores e motores, permitindo a redução de sua utilização tendo em vista a maior eficiência do padrão mecanizado. Logo a seguir, teria início o desenvolvimento genético e biológico. 
As variedades melhoradas em conjunto com os fertilizantes químicos e a motomecanização foram responsáveis por sensíveis aumentos nos rendimentos culturais. O número de pragas e doenças que atacavam as lavouras também cresceu enormemente e levou ao desenvolvimento de técnicas de proteção às plantas cultivadas. 
  • As duas grandes guerras mundiais impulsionaram uma série de avanços tecnológicos que foram adaptados para a produção de substâncias tóxicas às pragas e doenças. Muitas armas químicas produzidas foram transformadas em inseticidas para combater as doenças das lavouras.
No final dos anos 60 e início dos anos 70, os avanços do setor industrial agrícola e das pesquisas nas áreas química, mecânica e genética levaram a um dos períodos de maiores transformações na história recente da agricultura: a chamada Revolução Verde. 
  • A Revolução Verde fundamentava-se na melhoria do desempenho dos índices de produtividade agrícola, por meio da substituição dos moldes de produção locais ou tradicionais, por um conjunto bem mais homogêneo de práticas tecnológicas, onde as variedades vegetais geneticamente melhoradas, mais exigentes em fertilizantes químicos de alta solubilidade, agrotóxicos com maior poder, irrigação e a motomecanização. 
No que se refere ao aumento da produção total da agricultura, a Revolução Verde foi, sem dúvida, um sucesso. Entre 1950 e 1985, a produção mundial de cereais passou de 700 milhões para 1,8 bilhão de toneladas, uma taxa de crescimento anual de 2,7%. Nesse período, a produção alimentar dobrou e a disponibilidade de alimento por habitante aumentou em 40%, parecendo que o problema da fome no mundo seria superado pelas novas descobertas. 
  • A Revolução Verde espalhou-se rapidamente por vários países, mas a euforia das “grandes safras” propiciada pelo padrão tecnológico da Revolução Verde cederia lugar a preocupações relacionadas aos impactos sócio-ambientais e quanto à viabilidade energética. 
Como conseqüências ambientais aos impactos da agricultura convencional, temos: a erosão, a perda de fertilidade dos solos, a destruição floresta, a dilapidação do patrimônio genético e da biodiversidade, a contaminação dos solos e da água. No início do século XX foram criados no Brasil alguns institutos de pesquisa e escolas de agronomia que, a partir da década de 60, foram impactados pelo forte movimento da Segunda Revolução Agrícola. 
  • Nos anos 70, em meio à euforia do chamado “milagre econômico”, a adoção de um novo padrão tecnológico na Segunda Revolução Agrícola significava a abertura de um extenso mercado de máquinas, implementos, sementes e insumos agroquímicos. 
A estratégia agrícola expressa no Primeiro Plano Nacional de Desenvolvimento era “desenvolver a agricultura moderna de base empresarial que alcance condições de competitividade internacional em todos os principais produtos” (Novaes, 1993). O crédito agrícola teve um papel fundamental para uma melhor competitividade internacional. 
  • O governo criou linhas especiais de crédito atreladas à compra de insumos agropecuários, mecanismo que ampliou a dependência do setor produtivo agrícola em relação ao setor produtor de insumos. A agricultura passaria a exercer uma nova função, na criação de mercado para a indústria de insumos agrícolas. 
Também fazia parte desse conjunto de medidas a manutenção da estrutura agrária, baseada nos latifúndios e na produção patronal. As grandes fazendas eram consideradas mais adequadas ao processo de modernização e ao desafio de tecnificar a agricultura brasileira do que as propriedades familiares.
  • Grande parte dos produtores familiares foi excluída por não serem contemplados pelos benefícios governamentais. As monoculturas de grãos, altamente mecanizadas, exigem uma escala de produção mínima que os menores não conseguiam atingir. 
Além disso, muitos produtores não podiam arcar com os altos custos dos insumos modernos necessários à produção competitiva do mercado e foram obrigados a vender suas propriedades. Com isso a concentração da posse da terra foi ampliada, bem como o tamanho das propriedades. 
  • Muitos produtores, após venderem suas terras, migraram para as fronteiras agrícolas do centro-oeste ou para os centros urbanos que propiciavam mais ofertas de emprego. A lógica da produção monocultora permitia a utilização em larga escala da mecanização em quase todas as práticas agrícolas, possibilitando aos grandes fazendeiros uma grande redução da mão-de-obra empregada. 
Junto com os problemas sociais gerados pela modernização agrícola brasileira, evidenciaram-se os problemas ambientais decorrentes, em grande parte, da intensiva mecanização e do uso de agrotóxicos. Os agrotóxicos passaram a ser aplicados em doses exageradas, sem obedecer as normas e critérios de segurança exigidos nos países ricos. 
  • Apesar dos problemas sociais e ambientais, a “modernização” da agricultura brasileira foi responsável, no período de 1920 a 1970, por significativos aumentos da produção agropecuária no país. 
Esses números podem ser atribuídos à multiplicação do número de propriedades, principalmente, nos estados de fronteira agrícola como os da região norte e centro-oeste, à expansão das áreas cultivadas, ao crescimento dos rebanhos e às melhorias da produtividade do trabalho, da produtividade física das culturas e da criação animal. 
  • Nos anos 70, a agricultura brasileira mostrou um grande dinamismo quanto à evolução de seus principais componentes estruturais. A produção agrícola ampliou-se rapidamente, elevando a oferta de matérias-primas; o processo de modernização aprofundou-se, abrindo um significativo mercado interno para a produção industrial, e a incorporação de novas áreas à produção integrou à economia nacional zonas antes relativamente isoladas, conforme Kageyama e Silva (1983). 
A ineficiência energética e os impactos ambientais, como a erosão e a salinização dos solos, a poluição das águas e dos solos por nitratos (provenientes dos fertilizantes nitrogenados) e por agrotóxicos, a contaminação do homem do campo e dos alimentos, o desflorestamento, a diminuição da biodiversidade e dos recursos genéticos, e a dilapidação dos recursos não renováveis são os principais fatores que podem tornar insustentáveis os atuais sistemas de produção agrícola. 
  • Por mais que a agricultura moderna tenha avançado em técnicas que transcendam os limites naturais, a agricultura continua a depender de processos e de recursos naturais. A modernização da agricultura foi cercada de um otimismo excessivo por parte de grandes economistas ao avaliarem a capacidade de o capitalismo superar os chamados “limites naturais”.
A Caracterização do Cerrado:
  • Os cerrados ocupam aproximadamente um quarto do território brasileiro, pouco mais de 200 milhões de hectares e abrigando um rico patrimônio de recursos naturais renováveis adaptados às duras condições climáticas, edáficas e hídricas que determinam sua própria existência. 
Desse total, 155 milhões estão no planalto Central e 38,8 milhões de hectares no Nordeste, dos quais a maior parte (30,3 milhões) na região Meio-Norte: 43,3% da superfície do Maranhão é composta de cerrado e 64,7% da do estado do Piauí. Existem ainda áreas de cerrado em Rondônia, Roraima, Amapá e Pará, além de São Paulo. 
  • O cerrado é o segundo maior bioma brasileiro (depois da Amazônia) e concentra nada menos que um terço da biodiversidade nacional e 5% da flora e da fauna mundiais. A flora do cerrado é considerada a mais rica savana do mundo, e estima-se que entre 4 a 7.000 espécies habitam essa região. 
Embora a pesquisa científica localize apenas seis espécies vegetais ameaçadas de extinção, a maior parte dos indivíduos conhecidos aparece em apenas um lugar, cuja destruição provocaria a eliminação da própria espécie. 
  • Apesar de sua incontestável importância, é nítido o contraste entre o papel decisivo dos cerrados na manutenção dos grandes equilíbrios biogeoquímicos planetários e o valor secundário que lhe é atribuído pela opinião pública no Brasil e no exterior. O clima dominante da região é tropical-quente-subúmido, caracterizado por forte estacionalidade das chuvas e ausência de estacionalidade da temperatura média diária. 
Entretanto, as serras e planaltos altos de Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso do Sul experimentam sensíveis quedas de temperatura, inclusive geadas, caracterizando áreas de clima tropical de altitude. A água acumulada nos lençóis freáticos do cerrado do Centro-Oeste abastece nascentes que dão origem a seis das oito maiores bacias hidrográficas brasileiras, exceção apenas para as bacias do rio Uruguai e do Atlântico sudeste. 
  • Essa abundância hídrica é importante para a vegetação, pois permite o intercâmbio de sementes, pólen e mesmo a dispersão da fauna através das matas de galeria que acompanham córregos e rios, possibilitando que indivíduos do cerrado se acasalem com representantes da Amazônia, da mata atlântica, e da caatinga, o que contribui para aumentar a variabilidade genética das espécies. 
Os solos do cerrado do Centro-Oeste foram considerados, até o final dos anos sessenta, impróprios à agricultura. De fato, é mínima a proporção de latossolo roxo e de terra roxa estruturada: pouco mais de 5% do total. A pesquisa científica, entretanto, tornou os latossolos – que no Centro-Oeste ocupam 90 milhões de hectares – a área mais propícia para as culturas de grãos: os solos são profundos, bem drenados, com inclinações normalmente menores que 3%. 
  • Os latossolos são áreas privilegiadas de expansão da agricultura especializada em grãos, pela facilidade que oferecem à mecanização. Mas é importante não perder de vista que o crescimento dessas culturas supõe a adaptação do solo e do regime hídrico a plantas cujas exigências não podem ser satisfeitas pelos recursos disponíveis: mais que isso, tanto a mecanização como o uso em larga escala de fertilizantes químicos, de agrotóxicos e da irrigação contribuem, de modo decisivo, para empobrecer a diversidade genética desses ambientes.
Apesar disso, nas áreas de latossolo, os especialistas consideram possível a sustentabilidade da agricultura, desde que sejam adotadas técnicas elementares de manejo e de rotação de culturas visando o combate à erosão. O plantio direto – cuja adoção vem aumentando significativamente no cerrado do Centro-Oeste, tem aí um papel decisivo. 
  • A rotação de culturas é um dos principais meios para aumentar a oferta de grãos sem a abertura e a degradação de novas áreas. A precipitação anual no cerrado do Centro-Oeste varia de 800 a 2.000 mm, num clima sazonal caracterizado por chuvas e um período seco que se estende por quatro a sete meses, dependendo da região. 
Essa concentração das chuvas, sucedida por uma prolongada seca, determina a estratégia adaptativa das plantas de buscar água a 10m de profundidade, o que faz com que a vegetação e a vida animal no cerrado sejam mais importantes sob o solo do que acima de sua superfície. Na primavera e verão as chuvas, acompanhadas de trovoadas, são trazidas de noroeste para sudeste pelas linhas de instabilidade tropical, de origem amazônica, caracterizando como um clima de monções. 
  • As chuvas apresentam alta regularidade estacional, com 50% da precipitação anual caindo em apenas três meses, mas exibindo razoável variabilidade durante o ano no total precipitado. “Além disso, a vegetação de cerrado apresenta outras estratégias de adaptação aos períodos de seca, como germinação de sementes na época das chuvas e crescimento radicular pronunciado nos primeiros estágios de desenvolvimento das plantas.” (Assad e Assad, 1999). 
Já as plantas que dominam a paisagem da agricultura especializada em grãos supõem a presença de água nas camadas superficiais do solo. “Isto significa que, a substituição da vegetação de cerrado por áreas muito extensas cultivadas com plantas que utilizam mais água durante o ano, conduz a algum tipo de impacto na disponibilidade de água” (Assad e Assad, 1999). 
  • É interessante frisar também que os recursos hídricos são regulados e armazenados por uma imensa malha hídrica que já se ressente dos efeitos destrutivos das práticas dominantes de especialização agrícola. 
Apesar das restrições edáficas e hídricas, graças aos estudos para manejo de solos através de calagem, adubação, irrigação, e à topografia favorável ao plantio, baixo custo da terra, boa rede de estradas e proximidade dos centros consumidores, os Cerrados se transformaram nas últimas duas décadas na nova fronteira agrícola do País, a ponto de o Cerrado já ser hoje uma das maiores regiões produtoras de grãos do Brasil e ser reconhecido como a última grande fronteira agrícola do mundo. 
  • Infelizmente a ocupação econômica dos Cerrados tem ocorrido sem um adequado planejamento: os Cerrados são vistos pelos planejadores, financiadores e agricultores apenas como chão a ser ocupado, isto é, só se aproveita o Cerrado enquanto substrato para as atividades agrícolas, como se não houvesse mais nada aproveitável na região (Dias, 1992). 
Além da expansão da fronteira agropecuária, outros fatores ameaçam a integridade dos ecossistemas e recursos naturais renováveis dos Cerrados: construção de grandes barragens e estradas, mineração, agrotóxicos e a expansão urbana. Esses são alguns dos motivos pelos quais, 1,5% dos Cerrados está preservado por lei através de unidades de conservação.
  • Sem dúvida nenhuma, os Cerrados estão mais ameaçados e menos conhecidos que a Amazônia. A Mata Atlântica, por outro lado, está evidentemente mais ameaçada que os dois biomas acima, porém com menos de 10% de sua área primitiva pouco resta a fazer além de tratar de preservar e recuperar o que sobrou. 
O bioma Cerrado é aquele que deve merecer prioridade de conservação, tendo em vista o grau de ameaça que sofre e o potencial de utilização que ainda oferece. Segundo Dias (1992), para que sejam garantidos o uso racional e sustentável e a preservação dos recursos naturais renováveis dos Cerrados precisamos consolidar e divulgar os conhecimentos sobre a estrutura e funcionamento dos ecossistemas de Cerrado e seu comportamento em face de fatores impactantes. 
  • O Cerrado precisa ser manejado não apenas como substrato, tanto para preservar seu rico patrimônio genético quanto para viabilizar uma exploração sustentada de seus recursos. Afim de preservarmos o patrimônio genético dos Cerrados, precisamos considerar a biota, os ecossistemas em diferentes regiões, e os efeitos da fragmentação das áreas.
O potencial dos Cerrados:
  • A população mundial necessita de mais alimentos em quantidade e qualidade, a escassez do petróleo mostra a conveniência de se buscar outras fontes de energia, principalmente fontes renováveis, pesando sobre a agricultura grande responsabilidade de fornecer matérias-primas aos demais setores da economia.
A ciência vem contribuindo com novas alternativas para a produção de alimentos, de fibras e energia; a indústria suprindo o setor primário com insumos e máquinas a preços razoáveis e participando do processo e armazenamento; e o Governo estando envolvido no desenvolvimento de mercados, na política de preços, na organização e no suporte à pesquisa, à extensão rural e à educação. 
  • O aumento da oferta de produtos agrícolas pode ser feito basicamente de duas formas: aumentando a produtividade por unidade de área e expandindo em novas áreas. No Brasil, a maior parte de seu território ainda não foi ocupada, só recentemente sendo iniciada a utilização intensiva dos cerrados, onde os esforços estão sendo concentrados pela disponibilidade de tecnologia existente. 
As ocupações plenas, intensivas e racionais da região dos cerrados brasileiros podem produzir o dobro de alimentos do que atualmente é produzido. A obtenção desse resultado exige um suprimento adequado de insumos básicos, mão-de-obra especializada, maquinaria e crédito, bem como facilidades maiores de armazenamento e escoamento das safras. 
  • Além de concorrer para garantir alimentação ao crescente número de consumidores mundiais, a exploração racional dos cerrados brasileiros pode servir de modelo para outras áreas semelhantes localizadas principalmente na América do Sul (llanos) e na África (savanas).
Referencial teórico:
Fundamentos Teóricos dos Recursos Naturais na Agricultura:
  • As restrições impostas pelo ecossistema constituem um dos aspectos fundamentais do desenvolvimento sustentável. Observando essas restrições é possível manter a oferta dos serviços da natureza cada vez mais apreciados; minimizar custos, protelando o surgimento de retornos decrescentes sobre recursos naturais; e reduzir o risco mais grave da própria desestabilização do ecossistema. 
Há necessidade da intensidade e da forma do uso de recursos aos limites impostos pela taxa de regeneração natural, ou induzida pela tecnologia, dos recursos (Cunha,1994). Essa recomendação aplica-se em especial à agricultura, uma atividade em que a produtividade depende sobremaneira da interação de processos biológicos com o meio físico. 
  • A coerência ecológica dos processos produtivos, fundamental à sustentabilidade da produção agrícola a longo prazo, continua distante, sendo mais um desejo de ambientalistas e cientistas preocupados com os destinos da humanidade do que um componente da função-objetivo dos agricultores. 
A sociedade impõe demandas conflitantes sobre o meio ambiente, desejando mais produtos agrícolas e também a conservação ambiental. Mesmo essas demandas sendo de uma forma ou de outra compatibilizadas,nada assegura que a solução de curto prazo seja coerente com a de longo prazo. 
  • Tendo duas categorias de consumidores dos bens da natureza: os consumidores finais do meio ambiente e os produtores rurais como consumidores intermediários dos serviços do meio ambiente, o desenvolvimento da consciência ecológica transformou várias categorias de recursos naturais de bens intermediários em bens de consumo final. 
Esses recursos dão satisfação ao consumidor diretamente, alguns gerando utilidade até pelo fato de existirem. Atualmente são mais conhecidos os riscos da desestabilização de ecossistemas e temos noção das perdas que essa desestabilização representa para a sociedade. 
  • O avanço da ciência aumenta o poder do homem de transformar a natureza, mas não altera a regra de que se conformar com essas leis é, em gera, mais barato e mais seguro (Cunha, 1994). Da perspectiva do produtor agrícola, recursos naturais são insumos cujo valor decorre da capacidade que têm de gerar renda na forma de um fluxo de bens destinados ao mercado. 
Serão explorados com maior ou menor intensidade dependendo de como essa decisão influir no fluxo de renda. A demanda de recursos naturais é derivada da demanda de produtos agrícolas e é do aumento dessa demanda que gera as pressões pela intensificação da exploração dos recursos. Sentindo via mercados e sendo sinalizados por elevações de preços, vindo a sociedade fazer pressão pela conservação através de meios políticos.
  • Os agricultores diferem entre si pela capacidade de adoção de tecnologia moderna e que a sensibilidade do meio ambiente à ação antrópica é extremamente variada. Assim, a intensidade da restrição ecológica não varia apenas segundo as características de cada ecossistema como também pode ser flexibilizada com a ajuda de inovações tecnológicas. 
A capacidade produtiva do solo é literalmente consumida no decorrer do processo produtivo, desde que a pressão da demanda não exceda a capacidade natural de regeneração do solo, é viável a exploração sustentável mesmo em condições tecnológicas rudimentares. A tecnologia permite maior flexibilidade quanto à intensidade da exploração e a restrição ecológica tem sua importância reduzida, pelo menos aos olhos do produtor agrícola.

Material e Métodos:
Descrição:
  • A proposta dessa pesquisa teve como referencial, diversos estudos realizados por instituições que atuam direta ou indiretamente na temática da agricultura sustentável e no desenvolvimento do Cerrado e sua utilização como instrumento desencadeador de desenvolvimento nesse bioma. 
As justificativas apresentadas nesse documento permitem comprovar a relação existente entre o tema proposto e a área de concentração do curso MBA que está focado na Gestão Sustentável da Agricultura. 
  • Esse documento procurou demonstrar a importância e as potencialidades do desenvolvimento do Cerrado utilizando uma agricultura sustentável; concluir que a agricultura não é inviável em regiões de cerrado e sua expansão é uma considerável fonte de matérias-primas e divisas para o país; e apresentar uma estratégia de agricultura sustentável em regiões de cerrado que não pode ser baseada na continuidade do processo de degradação da grande riqueza que é a sua biodiversidade.
Resultados e Discussões:
A Ocupação dos Cerrados:
  • A ocupação do núcleo central dos cerrados teve início há muito tempo, sendo a área mais antiga a zona de Cuiabá em Mato Grosso. No século XVIII, os primeiros exploradores foram atraídos pelo ouro e pedras preciosas, iniciando assim o povoamento. 
Essas explorações tiveram importância definitiva no alargamento do território da então colônia portuguesa do Brasil. As reservas minerais preciosas eram modestas e logo se exauriram, levando a economia a regredir a uma agricultura de subsistência rudimentar. 
  • O avanço da fronteira agrícola iniciou-se nos cerrados quando, na década de 1930, foi construída a ferrovia que ligava São Paulo à cidade de Anápolis em Goiás, sendo assentadas mais intensivamente as regiões do Triângulo Mineiro e sul de Goiás. No entanto, a expansão somente se intensificou com a construção de Brasília e do sistema rodoviário na década de 1950. 
A ocupação da parte norte da região é bem mais recente e, ainda assim, limitada. Algumas dessas áreas haviam sido ocupadas ainda no século XIX, a partir de Belém, pelo sistema fluvial Tocantins-Araguaia. 
  • O sudoeste do Maranhão e o sul do Piauí receberam imigrantes oriundos de outras partes do Nordeste, mas a agricultura também era essencialmente de subsistência. 
O desenvolvimento agrícola do Cerrado deve-se, de forma geral, pelas seguintes razões:
  • Política de combate à escassez de terras cultivadas nas regiões agrícolas já exploradas no país; ampliação da extensão de administração agrícola, bem como a distribuição de terras dentro das respectivas famílias;
  • Melhoria na auto-suficiência do país e o incremento da capacidade de exportação e produtos agrícolas;
  • Promoção do equilíbrio da administração civil e a construção de cidades, produzindo alimento e emprego, através da exploração de regiões não aproveitadas e despovoadas;
  • Assumir a posição de “celeiro” para o mundo, aumentando a distribuição de alimentos para o mundo;
  • Contribuição para o desenvolvimento agrícola futuro em outras regiões do mundo.
O padrão de crescimento da agricultura na região de cerrados seguiu a relação de custos de fatores previstos. À época em que se intensificou a ocupação, o preço da terra nua na região de cerrados girava em torno de uma terça parte dos preços registrados nas regiões agrícolas do Sul e Sudeste. A terra, como bem de capital, vale por sua capacidade de gerar renda.
  • Descontada a capacidade produtiva, não haveria diferença entre o preço da terra nas regiões agrícolas tradicionais e aquele nas novas áreas de cerrados. Cunha (1994) cita dois argumentos para justificar a terra mais barata nos cerrados. 
Primeiro referindo-se à especulação de investidores pela demanda da terra, mesmo esta não gerando renda – na forma de ganhos de capital – e não contribuindo para a produção. O segundo argumento tem a terra como fator de produção. Se for verdade que a terra em seu estado original tinha valor econômico próximo de zero, a capacidade produtiva da terra transformada é equivalente à da terra no Sul e Sudeste, senão superior. 
  • Para completar, o custo da transformação de terra improdutiva em terra produtiva, que não chegava a compensar o diferencial de preços da terra nua nos cerrados e no Sul, foi reduzido pelos subsídios oferecidos. Vale citar um outro argumento, o de que o baixo preço da terra devia, além dos fatores já citados, à maior distância em relação aos mercados consumidores. 
As inovações tecnológicas resultaram na elevação da produtividade e permitiram que a terra de boa qualidade se tornasse abundante nas regiões de cerrado. Essas novas tecnologias permitiram uma alta nos preços das terras virgens ou de baixa qualidade, dando lugar a uma terra de melhor qualidade, com a utilização de novas técnicas. 
  • Um importante papel para a expansão agrícola do cerrado foi a ida de “gaúchos” para o cerrado brasileiro. No início da década de 1970, agricultores do sul do país puderam adquirir grandes quantidades de terra nua no Centro-Oeste pela venda de suas terras no sul, num momento de grande redução da oferta no sistema de crédito rural oficial. 
Segundo Rezende (2002), esses “gaúchos” teriam cumprido um papel estratégico na adoção de novas tecnologias: devido à boa qualificação prévia.

Políticas que influenciaram: 
A Expansão Agrícola nos Cerrados:
  • A estratégia brasileira de crescimento e as políticas que a viabilizaram tiveram considerável impacto no alargamento da fronteira agrícola, principalmente na fase de crescimento acelerado da economia no período do milagre econômico brasileiro. 
As altas taxas de crescimento geraram um clima de otimismo de que o Brasil se tornaria uma potência econômica. Após esse otimismo surge uma prolongada crise, mas os investimentos continuaram a impulsionar a expansão agrícola por algum tempo. 
  • Durante o período de crescimento rápido as perspectivas otimistas contagiavam os agricultores e o crescimento urbano-industrial repercutia favoravelmente sobre o setor rural, mas a política econômica continuava sendo manifestamente antiagrícola (Cunha, 1994). 
Enquanto as exportações de manufaturados eram isentas de toda tributação e recebiam subsídios, as agrícolas in natura estavam sujeitas à elevada tributação indireta. 
  • A agricultura brasileira é super tributada e os mecanismos fiscais e extrafiscais retiraram mais renda da agricultura do que nela injetaram. A contrapartida em favor da agricultura foi a quase total isenção de imposto de renda que beneficiava o setor.
Políticas e programas governamentais tiveram impactos diretos sobre as áreas do cerrado, introduzindo melhores infra-estruturas, favoreceram a produção agrícola. Destacam-se: o Programa Especial de Desenvolvimento da Grande Dourados, o Programa Especial da Região Geoeconômica de Brasília e o Programa Integrado de Desenvolvimento do Noroeste do Brasil (Polonoroeste). 
  • Além desses programas, o Polocentro e o Prodecer foram os que tiveram maior impacto sobre o crescimento da agricultura de cerrados.

O Desenvolvimento Sustentável da agricultura no cerrado brasileiro

O Polocentro:
  • Os resultados não satisfatórios das políticas de aberturas e ocupação da Amazônia e o desejo de dar densidade econômica a extensas áreas do Brasil Central levaram à criação, em 1975, do Programa para o Desenvolvimento dos Cerrados (Polocentro). O programa selecionou 12 áreas de cerrados com alguma infra-estrutura e razoável potencial agrícola. 
Essas áreas receberam recursos para investimentos em melhorias da infraestrutura já disponível e foram também beneficiadas por um generoso programa de crédito subsidiado a agricultores que se dispusessem a cultivá- las. 
  • O Polocentro teve como objetivo propiciar a ocupação racional e ordenada dos cerrados, difundindo a tecnologia agropecuária, permitindo elevados níveis de produtividade, e ao mesmo tempo, aumentando e preservando a fertilidade do solo. O Programa beneficiou principalmente médios e grandes produtores no período em que vigorou (1975-1982). 
Nesse período foram aprovados 3.373 projetos, em um montante de recursos equivalente a 577 milhões de dólares. Dos beneficiários, 81% operavam áreas de mais de 200 hectares, que absorveram 88% do crédito oferecido. 
  • O Polocentro procurou transformar a agricultura de subsistência em uma agricultura empresarial, no sentido de uso de práticas agrícolas modernas e a integração com o mercado, através de ampla assistência técnica, apoio financeiro e de infra-estrutura. 
As razões do Polocentro seriam a de demonstrar a viabilidade econômica de utilização dos cerrados para agropecuária, revelando que a ocupação indiscriminada dessas terras, sem a utilização de tecnologia adequada, envolvia altos riscos, com prejuízos para a economia do País e para empresários agrícolas (Alencar, 1979). 
  • A estratégia do Programa consistia na implantação dos pólos de desenvolvimento, localizados de modo a facilitar a difusão da tecnologia agrícola adequada para toda a extensão dos cerrados. A sua ação foi desenvolvida através da integração entre a pesquisa, assistência técnica, crédito rural orientado e apoio de infra-estrutura, a par de facilidades para formação de patrulhas mecanizadas. 
Desde o início do Programa já havia uma tecnologia que permitisse e mesmo recomendasse o início do aproveitamento racional dos cerrados – com o objetivo de evitar a degradação do seu solo como conseqüência de uma ocupação indiscriminada, verificou-se a insuficiência do conhecimento sobre a área. 
  • O sistema de assistência técnica desempenhava um papel fundamental no Polocentro, sendo o principal responsável pela introdução e difusão de práticas agrícolas adequadas para toda a extensão dos cerrados. Essa assistência técnica não se limitou apenas aos projetos financiados pelo Programa, o que permitiu a orientação de cerca de 34 mil produtores. 
O apoio de infra-estrutura do Polocentro estava voltado para garantir condições mínimas de armazenamento, transporte e eletrificação nas áreas de maior potencial produtivo. Quanto à armazenagem, foi feito um balanço da capacidade armazenadora existente em áreas selecionadas, e da perspectiva de expansão, permitindo a adequada localização dos armazéns. 
  • O transporte era proporcionado às jazidas de calcário e áreas de maior e imediato potencial produtivo. A energia era voltada para garantir o suprimento necessário para a moagem de calcário e facilitar o emprego de equipamentos modernos. 
A análise do desempenho do Polocentro, ao final do terceiro ano de execução, indicava que o mesmo vinha obtendo resultados acima da expectativa inicial. Os seus objetivos e metas estavam sendo alcançados ou superados, através do adequado suporte técnico, financeiro e de infraestrutura. 
  • Os diversos pólos de desenvolvimento, estrategicamente localizados, facilitavam a difusão da tecnologia agrícola, sem a qual os riscos dos investimentos seriam altos (Alencar, 1979). 
A produtividade conseguida nos projetos do Polocentro foi sendo elevada, em decorrência das pesquisas desenvolvidas, do aperfeiçoamento da capacidade empresarial para o cerrado e da utilização mais intensa de capital, permitindo uma maior produção por hectare com duas ou mais culturas anuais aproveitando a mesma área e reduzindo os riscos. 
  • Segundo Cunha (1994), nos primeiros cinco anos, o Polocentro foi responsável pela incorporação direta de cerca de 2,4 milhões de hectares à agricultura de cerrados, correspondentes a 31% da área total acrescido aos estabelecimentos agrícolas nas zonas atingidas pelo programa. O Polocentro teve como objetivo, destinar 60% da área explorada dos estabelecimentos às lavouras e os restantes 40% às pastagens. 
O resultado foi justamente o inverso, sendo que a soja ocupou a maior parte, ficando o arroz em segundo lugar nas áreas de lavoura. Um importante componente do Polocentro foi o incentivo à pesquisa agronômica, desenvolvendo tecnologias para o cultivo produtivo e rentável dos solos ácidos e de baixa fertilidade dos cerrados. 
  • O Polocentro transferiu à Embrapa recursos para a intensificação de pesquisas, sendo feito com grande sucesso. Os resultados obtidos pelo Programa demonstraram uma relação benefício/custo, em termos sociais e econômicos, altamente positiva para o País. 
Destacando-se as seguintes realizações: rápido retorno financeiro; criação de grande número de empregos; oportunidade para pequenos agricultores; preservação dos solos dos cerrados; aperfeiçoamento da tecnologia de uso dos cerrados; e estabelecimento de facilidades para expansão da fronteira agrícola. 
  • O Polocentro foi bem sucedido em induzir a expansão da agricultura comercial nos cerrados, tendo o governo “pago” aos agricultores para que cultivassem a terra em seu próprio proveito, presumindo que seu impacto indireto tenha sido maior que o impacto direto.
O Prodecer:
  • O PRODECER é o Programa de Cooperação Nipo-Brasileira para o Desenvolvimento dos Cerrados, idealizado em 1974, negociado entre os governos do Brasil e do Japão durante 5 anos e implementado a partir do ano de 1978, tendo sido o coordenador político-institucional, o Ministério da Agricultura e do Abastecimento e a coordenadora de implementação, a CAMPO, financiado pelos Governos do Brasil, do Japão (JICA/OECF) e bancos privados japoneses. Sua execução é de responsabilidade da Companhia de Promoção Agrícola - CAMPO, empresa de capital binacional, criada para este fim, com 51% das ações pertencentes ao lado brasileiro, representado pela BRASAGRO e 49% do lado japonês, representado pela JADECO. 
Em ambas partes existe a participação governamental e privada. O Programa de Cooperação Nipo-Brasileiro para o Desenvolvimento dos Cerrados (Prodecer) deu considerável impulso à agricultura dos cerrados no noroeste de Minas Gerais e oeste da Bahia. O Prodecer promoveu o assentamento de agricultores provenientes do Sul e Sudeste, selecionados por sua experiência anterior na administração de propriedades agrícolas. 
  • O Prodecer tem como objetivo: estimular e desenvolver a implantação de uma agricultura moderna, eficiente e empresarial, de médio porte, na região dos cerrados, com vistas ao seu desenvolvimento, mediante a incorporação de áreas ao processo produtivo, dentro de um enfoque sustentável. 
Dentro do Programa, a qualidade ambiental tem sido preservada, o que é comprovado por levantamentos sistemáticos realizados antes e durante e depois da implantação dos projetos relativos a avaliação dos impactos representados pelas derivações dos cursos d’água para os projetos de irrigação, da manutenção da biodiversidade dos insetos e da preservação das reservas vegetais e de sua biodiversidade. 
  • O público beneficiário do Programa é constituído de médios agricultores associados a cooperativas, com características de capacidade de adoção tecnológica, tanto gerencial quanto de produção, espírito empreendedor, etc., que conduzam os projetos a atingirem os objetivos do Programa. 
O programa tem um enfoque de desenvolvimento regional uma vez que, com sua proposta, desenvolve paralelamente à produção, a infraestrutura econômica e social, num apoio logístico à competitividade dos cerrados. 
  • O montante de empreendimentos do PRODECER (Fases I, II e III) é de US$ 570.000.000,00 e foi incorporado ao processo produtivo uma área aproximada de 350.000 hectares de Cerrados nos 7 (sete) Estados brasileiros: MG, GO, BA, MS, MT, TO e MA.
A primeira fase beneficiou a região sul dos cerrados, mais especificamente o Estado de Minas Gerais. A segunda, a área central dos cerrados, nos estados de Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Bahia. Atualmente se encontra em fase de implantação a fase III, zona norte dos cerrados, nos estados de Tocantins e Maranhão.
  • O Prodecer beneficiou até o momento 758 colonos com uma área cultivada de 353.748 ha (quadro detalhado por Estado no final). As produtividades alcançadas têm sido significativamente superiores às nacionais, equivalendo e mesmo, em alguns casos, superando as da agricultura norte-americana. O efeito demonstração e irradiação têm multiplicado esta área na região várias vezes. Gerou-se milhares de empregos, contribuindo para a redução do êxodo rural. 
Áreas despovoadas ou pequenas vilas transformaram-se, com a implantação dos projetos, em importantes pólos regionais. O principal instrumento do Prodecer é o crédito supervisionado, com linhas de crédito abrangentes, eram previstos empréstimos fundiários, para investimentos, para despesas operacionais e para assistência ao colono. 
  • O programa atraiu agricultores qualificados que, via de regra, têm sido bem sucedidos (Mueller, 1990). Embora o número de beneficiários diretos do programa tenha sido limitado pela disponibilidade de recursos, considera-se que o impacto do projeto não se restrinja ao relativamente pequeno número de famílias diretamente envolvidas (Cunha, 1994). 
A partir do sucesso da primeira etapa do Prodecer, houve o interesse de continuar a promover a exploração econômica dos cerrados através do Prodecer II, que foi implementado a partir de 1985, também objetivando o assentamento de colonos selecionados por cooperativas credenciadas.
  • Atualmente está em desenvolvimento a fase III do Programa, com a consolidação de dois projetos na área norte dos cerrado – um em Pedro Afonso, Tocantins e outro em Balsas, no Maranhão. Até então, é esperado que se consolide a implantação de 81 projetos, com uma área agrícola explorada de 41.000 ha, incorporando a irrigação nos projetos que ainda faltam, a exploração da fruticultura, sua pós-colheita e comercialização, com a finalidade de elevar a rentabilidade das unidades. 
A Tecnologia para o Desenvolvimento Sustentável no Cerrado:
  • O desenvolvimento de tecnologias possibilitou a definitiva incorporação dos cerrados à agricultura brasileira, transformando a região no principal pólo de crescimento da produção agrícola do país. 
A agricultura dos cerrados brasileiros é sem dúvida um produto da tecnologia moderna, onde os índices de produtividade equiparam-se aos das melhores regiões produtoras, sendo igualmente competitivos os custos de produção. Foram as pesquisas que permitiram a incorporação dos cerrados ao cenário agrícola brasileiro, avançando em várias direções. 
  • A primeira foi no aprofundamento do conhecimento dos ecossistemas que compõem a região, nos seus diversos aspectos, assim como de seus recursos minerais e hídricos. A segunda direção de desenvolvimento constituiu-se na denominada “construção do solo” agrícola. Para os solos ácidos e pobres em nutrientes da região que eram imprestáveis à agricultura, foram desenvolvidas formas de limpeza e preparo do terreno, de correção da acidez e de fertilização. 
Outra linha em que avançou a pesquisa foi a do desenvolvimento de variedades de plantas adaptadas às características do meio ambiente. Cereais, leguminosas, forrageiras e outras foram os principais itens das várias espécies vegetais pesquisados. 
  • As espécies desenvolvidas caracterizam-se pela maior profundidade do sistema radicular, maior tolerância à toxidez do alumínio, adaptação ao período de claridade e maior resistência a veranicos, além da maior capacidade de resposta à fertilização e adaptação à mecanização do cultivo. Todos esses desenvolvimentos têm sido absorvidos pelo sistema produtivo em prazo muito curto. 
Os novos produtos, sementes, químicos, implementos mecânicos, ou de outra natureza, são produzidos em escala industrial e estão disponíveis no mercado. O processo de adoção da nova tecnologia foi igualmente facilitado por uma outra circunstância da maior relevância: assim como a agricultura, os agricultores dos cerrados também “nasceram modernos”. 
  • Grande parte daqueles que participam do processo de abertura da região são imigrantes de zonas de agricultura mais avançada do sul e sudeste, ficando a população local à margem do processo ou vendendo a terra aos que dispuseram a apostar na nova agricultura. 
O desenvolvimento tecnológico é um processo contínuo. O progresso tecnológico deve ser amparado por um sistema de pesquisas capaz de responder aos novos desafios e dificuldades continuamente apresentadas. O crescimento sustentável requer mais da tecnologia que ganhos de produtividade, sendo necessário que a tecnologia seja coerente com os requisitos da conservação ambiental. 

Os Sistemas de Produção no Cerrado:
  • Os sistemas de produção que prevalecem na região de cerrados decorrem, em grande parte, das características físicas, econômicas e demográficas da região. Primeiramente destaca-se a baixa densidade demográfica, sendo um dos condicionantes da oferta de mão-de-obra no meio rural, com 80% da população residindo em cidades e vilas. 
Nas áreas de terras mais férteis, onde se concentram os pequenos estabelecimentos, a densidade é um pouco maior. Tais áreas fornecem os “boias-frias” que suprem a forte demanda estacional de mão-de-obra (Cunha, 1994). Em segundo lugar há o peculiar regime de chuvas. 
  • O período chuvoso pode retardar-se ou começar mais cedo, fazendo com que os agricultores retardem o plantio até que um perfil de 15 cm de solo tenha recebido umidade suficiente. O período de plantio pode ser assim muito curto. Em conseqüência, equipamentos capazes de plantar grandes áreas por dia são requeridos. 
Segundo Landers (1996) é de grande utilidade ter como referência o processo natural de ciclagem de materiais em ecossistemas naturais, sem perturbação humana a esse tipo de regime pluvial. Ênfase deve ser colocada nas diferenças entre a dinâmica dos agroecossistemas e os ecossistemas naturais; especialmente em dois aspectos-chave como a exportação e a decomposição. 
  • Todos os materiais exportados pelo agroecossistema vão precisar de algum tipo de reposição. No processo de decomposição de elementos importados, estes devem possuir as características mais semelhantes possíveis às dos elementos exportados, que estão tentando substituir e cuja decomposição vai acontecer em outros lugares. 
O déficit hídrico também impossibilita a realização de uma segunda safra por ano. Máquinas e equipamentos ficam subutilizados, o mesmo ocorrendo com a mão-de-obra permanente. A tendência, portanto, é reduzi-la ao mínimo: um administrador e dois tratoristas para cada 400 hectares de grãos, por exemplo, sendo o contingente de trabalhadores completado por mão-de-obra temporária. 
  • Interagem-se assim as condições do mercado de trabalho (oferta e demanda) e as características naturais da região para estimular o desenvolvimento da agricultura em direção à intensa mecanização. Por último, há de se mencionar a baixa fertilidade natural dos solos. Sem substancial aporte de capital não há como torná-los produtivo. 
No entanto, uma vez recuperados, exigem, para a mesma produtividade, quantidade de fertilizantes equivalente à das áreas férteis do país. Pela exigência de aporte de recursos financeiros, e mais particularmente de recursos humanos, quase não há espaço para a agricultura de subsistência. 

O Plantio Convencional e o Plantio Direto:
  • Segundo Cunha (1997), a agricultura convencional nos cerrados pode ser caracterizada pela grande escala de produção, pela mecanização intensa e pelo uso intensivo de capital, de fertilizantes químicos e de pesticidas. 
O aumento da escala da produção agrícola provoca a redução dos custos fixos médios e eleva a produtividade física das culturas produzidas, levando assim à maximização da eficiência da produção, dados os recursos econômicos disponíveis. 
  • Esse sistema de exploração gerou sérios problemas ambientais que motivaram questionamentos sobre a sustentabilidade das técnicas agrícolas tradicionais em um ecossistema frágil como os cerrados brasileiros (Shiki, 1997). O plantio direto – PD – é um processo de semeadura em solo não revolvido, no qual a semente é colocada em sulco, ou covas, com largura e profundidade suficiente para obter uma adequada cobertura e um adequado contato da semente com a terra. 
Os controle de pragas, doenças e ervas daninhas são geralmente feitos por meio de métodos químicos, combinados ou não com práticas mecânicas e culturas específicas. Esse plantio é caracterizado pela semeadura realizada diretamente sobre os restos culturais do cultivo anterior, sem nenhum preparo do solo (aração e gradagem). 
  • Existe, portanto, maior permanência dos resíduos vegetais na superfície do solo, protegendo-o contra o processo erosivo no período entre dois cultivos. Além disso, quando o solo é manejado sob o plantio de forma adequada, ocorre acumulação de nutrientes e resíduos vegetais nas camadas mais superficiais, ocasionando, portanto, maior fertilidade do solo.
Segundo Landers (1996), o plantio direto foi introduzido no país em 1969, em Não-Me-Toque, RS, com o plantio experimental de sorgo. Em relação às técnicas convencionais de preparo e cultivo do solo, o PD permite eficiente controle da erosão, pela manutenção de uma cobertura morta (palha) sobre o solo. 
  • A adoção do PD foi uma reação espontânea de agricultores à falta de sustentabilidade física e econômica do sistema de plantio convencional, intensivamente mecanizado, em função dos efeitos da erosão e do alto investimento em maquinário. 
As principais características técnicas do plantio direto, que reduzem o impacto erosivo nos solos, são (Landers, 1996):
  1. A eliminação do uso de práticas agrícolas convencionais, como a aração e a gradagem, reduzindo a movimentação de máquinas sobre o solo, bem como a pulverização da estrutura física do solo.
  2. Criação de uma cobertura permanente de palha na superfície, aumentando a fertilidade do solo.
  3. Plantio com máquinas especializadas que cortam a palha para inserir simultaneamente a semente e o adubo (racionalização do uso de insumos).
A técnica de plantio direto vem sendo utilizada por um número crescente de produtores na região dos cerrados brasileiros. 
  • A partir do início dos anos noventa, a área destinada para plantio direto nos cerrados brasileiros correspondia a 8,7% do total destinado em todo o Brasil. Já na safra 1995/96 este percentual subiu para 33,33%. No mesmo período, a área brasileira destinada para o plantio direto crescia 3,5 vezes e nos cerrados brasileiros cresceu cerca de 17 vezes.
No final da década de 80, o plantio direto era considerado praticamente inviável economicamente para os cerrados, a não ser em uma situação de longo prazo (Cunha, 1997). Esse autor demonstra que, no final da década de 1980, o plantio direto tinha custos superiores ao plantio convencional. 
  • No cultivo da soja e do milho o plantio direto apresentava custos 6% e 5% superiores ao plantio convencional, respectivamente. Já na avaliação de Landers, em 1996, o plantio direto demonstrava custos menores que o plantio convencional no caso do milho (-1,99%) e na soja a técnica conservacionista apresentava um custo superior em 2,43%, apresentando grande proximidade nos custos privados entre o plantio direto e convencional no caso das duas culturas. 
Os benefícios do plantio direto para toda a sociedade estão na conservação dos recursos naturais, diminuindo significativamente a erosão, o assoreamento e a poluição de rios e represas. Com isso, preserva-se a biodiversidade do solo, da água e da superfície terrestre, condiciona-se o ambiente para a manutenção e, muitas vezes, para o aumento da produtividade agropecuária. 
  • Dessa forma, esses benefícios constituem-se em um catalisador, para se lograr o racional manejo das bacias hidrográficas, considerando-se o potencial de aplicação dos princípios do sistema de plantio direto, nas várias atividades da agricultura em qualquer escala de produção
A Conservação do Cerrado e as Perspectivas Ambientais:
  • Nos últimos 300 anos a humanidade vem transformando profundamente os ecossistemas naturais. O crescimento populacional, o avanço da agricultura moderna, a urbanização, a emissão de poluentes industriais e a exploração não sustentável dos recursos naturais têm feito com que a atividade humana seja o principal fator das mudanças ambientais. 
Essa degradação ambiental vem causando mudanças abruptas na estrutura e funcionamento dos ecossistemas, acarretando um empobrecimento biológico, que se manifesta na extinção de espécies, perda da capacidade produtiva dos ecossistemas, alteração dos ciclos biogeoquímicos, aquecimento global e proliferação de espécies exóticas. 
  • O Brasil possui cerca de 3,7% de seu território legalmente protegido, um percentual acima da média mundial de 3,1%, mas abaixo da sul-americana de 4,5%. A carência de áreas de conservação no Cerrado evidencia-se pela comparação do esforço conservacionista governamental dos ecossistemas Amazônicos, que contam com 12% de sua área protegida na forma de unidades de conservação, contra menos de 2% no Cerrado. 
Esta discrepância estende-se ao tamanho das unidades de conservação: a maioria das unidades na Amazônia possui área superior a 100 mil hectares, enquanto que no Cerrado apenas 10% das unidades possui área acima de 50 mil hectares (Dias, 1994). 
  • A partir de dados do IBGE, IBAMA e EMBRAPA, atualmente cerca de 37% da área do Bioma do Cerrado já perdeu sua cobertura primitiva, sendo sua flora e fauna ocupada atualmente por diferentes paisagens antrópicas: pastagens plantadas, culturas temporárias, culturas perenes, represamentos, áreas urbanas e áreas degradadas abandonadas. 
Várias espécies de plantas e animais nativos ainda sobrevivem nas áreas de paisagem antrópica, porém tendem a desaparecer por falta de preocupação com sua preservação. Os principais obstáculos para a conservação da biodiversidade do Cerrado podem ser sumarizados assim: baixo valor atribuído aos seus recursos biológicos; exploração não sustentável dos recursos; insuficiência de conhecimentos sobre ecossistemas e espécies; os resultados dos poucos estudos científicos existentes não são direcionados para a resolução de problemas ambientais; as atividades conservacionistas da maioria das organizações têm tido um espectro muito restrito; as instituições responsáveis pela proteção da biodiversidade enfrentam dificuldades organizacionais e financeiras (Klink, 1995). 
  • O latifúndio que, no Cerrado, mantém as mesmas características das regiões atrasadas ainda constitui a maior reserva de terras existentes no país. Por outro lado, os chamados latifúndios produtivos, como os do maior produtor de soja do mundo com seus 50.000 ha plantados no Mato Grosso do Sul, significam um risco ambiental que deve ser evitado. 
As regiões agrícolas devem ter parte de suas áreas conservadas com vegetação natural, e serem diversificadas em culturas para evitar a proliferação de pragas, enquanto que as reservas servirão para a guarda de predadores de pragas e corredores ecológicos de flora e fauna nativas.
  • O esforço realizado pelo Governo na conservação da natureza no Bioma do Cerrado tem sido insuficiente, e boa parte das iniciativas ficou no papel. A continuidade dessa situação poderá dar ao Bioma do Cerrado o mesmo destino da Mata Atlântica. 
Ainda há possibilidade de mudar essa situação (especialmente nas regiões mais ao norte de Cerrado) e ter um futuro mais promissor com opções de usufruto desse patrimônio natural para as próximas gerações. Atualmente dois terços do Bioma do Cerrado estão ainda cobertos por paisagens naturais, porém o processo de ocupação e destruição desse Bioma é rápido. 
  • A atual década deve ser a última para se fazer alguma coisa, nesses anos vemos uma mudança substancial na política e ações conservacionistas pública e privada, ou será o fim do Cerrado como Bioma.
Fatores de Degradação Ambiental no Cerrado:
  • Cunha (1994) realizou um diagnóstico amplo das dificuldades que poderão comprometer a sustentabilidade do crescimento da agricultura nos cerrados, dando importância à manutenção da sustentabilidade, e enfatizando que a estagnação não é sinônimo de conservação. 
Quanto mais acelerado for o crescimento, maior será a pressão sobre a base de recursos. Em nosso país é enorme a pressão exercida pela expansão da demanda de alimentos e outros produtos agrícolas, mas a preocupação deve ser a melhor opção de crescimento: vertical ou continuando com a expansão horizontal da fronteira de produção. 
  • Como problemas de crescimento horizontal, vale citar a transformação mais extensa do espaço natural, a redução do habitat de espécies selvagens, a destruição de germoplasma e a perturbação de ecossistemas intactos. 
A intensificação do cultivo é acompanhada da maior degradação dos solos, quebra do equilíbrio ecológico pelo monocultivo de extensas áreas contínuas e contaminação química do meio ambiente. Nos cerrados brasileiros, a combinação de espaço livre e a intensificação do cultivo e o crescimento ao longo da margem extensiva (Cunha, 1994). 
  • Mesmo os mais modernos e empreendedores produtores não hesitam em investir em uma tecnologia que eleve a produtividade da lavoura enquanto recusam outra que impedirá que a produtividade caia. O menor planejamento do horizonte no uso dos cerrados brasileiros é explicado pela instabilidade da economia, a margem de lucro reduzida e inexistência de fontes de financiamento a prazos compatíveis com o prazo de maturação dos investimentos. 
Uma forma de investimento é a conservação dos recursos naturais, sendo de longo prazo e maturação. Os altos juros tendem a inviabilizar esses investimentos, não importando o tamanho dos benefícios. A estagnação da economia gera falta de recurso, inclusive na forma de créditos, para os investimentos. 
  • As oscilações drásticas dos preços agrícolas podem diretamente levar com que os recursos naturais sejam explorados a taxas superiores àquelas compatíveis com a capacidade de regeneração natural. No caso de preços altos, os produtores são estimulados a extrair o máximo dos recursos,aproveitando a oportunidade. 
As terras não aptas podem ser cultivadas e a exploração intensificada a nível predatório. A redução da instabilidade de preços deve ser um dos componentes de uma política agrícola comprometida com a preservação ambiental. 
  • A legislação ambiental brasileira, em vez de criar incentivos à conservação ambiental, optou pela regulamentação que – embora esbarre em dificuldades de implementação – cria incentivos opostos aos desejados: ela estimula a destruição de redutos cujo melhor uso é a preservação permanente. (Código Florestal, Lei nº 7.803, de 18/07/89). 
Um exemplo é o de áreas de florestas, no qual o problema está na legislação que trata como se fossem públicas as áreas de reservas dentro do limite privado. O proprietário literalmente perde o direito de desfrutar de parte de sua propriedade (sem autorização de algum burocrata) e vê reduzido o valor da terra ainda não explorada. 
  • Para fugir ao custo de ter em sua propriedade bens sobre os quais incidem os ônus da preservação, os agricultores são induzidos a derrubar matas e a apressar a transformação de áreas de reservas. A sociedade estaria melhor se os proprietários rurais, movidos por incentivos, fossem transformados em seus parceiros, trabalhando pelo objetivo comum da preservação. 
A questão tecnológica está no ponto principal da questão da sustentabilidade do crescimento da agricultura nos cerrados. A tecnologia agrícola é o ponto principal não somente dos problemas assim como também das soluções; daí o destaque especial da análise a essa questão. 
  • A tecnologia multiplicou a capacidade do homem de agir sobre o meio ambiente, permitindo o aproveitamento de áreas antes imprestáveis, mas trouxe com ela o risco de que a base de recursos naturais seja pressionada além dos limites de sua capacidade de suporte. 
Nas condições dos cerrados, embora haja espaço para o alargamento horizontal da fronteira produtiva, para esse alargamento ser sustentável, não pode prescindir da contribuição da tecnologia moderna. 

Conclusões:
  • O Cerrado encontra-se totalmente na região tropical e representa, hoje, não somente para o Brasil, mas para o mundo, uma das últimas alternativas viáveis e com alto potencial de produção agrícola. Entretanto, sua utilização para este fim requer uma série de precauções e medidas que visem o seu desenvolvimento sustentável, sem esgotamento dos recursos naturais, tão abundantes desta região. 
Os obstáculos para atingir a sustentabilidade na agricultura são principalmente barreiras socioculturais, tanto ao nível do produtor agrícola como dos pesquisadores da agropecuária. No caso dos produtores, existe o costume arraigado de maximizar os lucros no curto prazo, e de não providenciar o cuidado com os recursos naturais envolvidos no processo produtivo e na conservação ou melhora do ambiente ou dos recursos genéticos. 
  • A área transformada dos cerrados excede em muito a área cultivada, mas a área cultivada sofreu o desmatamento ou a limpeza do terreno. As áreas inaptas a lavouras estão sendo submetidas a cultivo intenso e que a baixa capacidade de suporte do ecossistema à exploração agrícola é ignorada. 
A degradação do solo é a principal ameaça ambiental à sustentabilidade do crescimento agrícola na região dos cerrados. Grande parte dos solos é fortemente susceptível à erosão; diante de chuvas torrenciais e de solos compactados, as técnicas tradicionais de prevenção, como plantio em curvas de nível, são insuficientes e, em algumas áreas, até mesmo inapropriadas. 
  • O cerrado possui um grande potencial de crescimento, além da imensa base de recursos naturais, pelo contínuo progresso tecnológico. Apesar desse potencial, a sustentabilidade do crescimento está ameaçada pela desmobilização do sistema de pesquisas, interrupção de projetos e por fatores que dificultam a difusão das inovações: preços altos de insumos, juros altos, instabilidade de preços de produtos e o maior risco de preços que decorre das altas taxas de inflação. 
Todos esses problemas reduzem a competitividade da agricultura, expondo-a ao risco da insustentabilidade. A necessidade de uma política de incentivos ao crescimento sustentável da agricultura, na qual incluiria a estabilização da economia, o provimento de crédito a juros internacionais para investimentos em tecnologias poupadoras de recursos, a redução da instabilidade dos preços de produtos agrícolas, o apoio à pesquisa, a correção de distorções de mercado, a regularização da situação fundiária, a incorporação das restrições ecológicas à programação dos investimentos públicos e, o treinamento da mão-de-obra e a educação geral da população. 
  • Verifica-se que qualquer política comprometida com a sustentabilidade do crescimento deve levar em conta todo o conjunto desses fatores mencionados. A agricultura nos cerrados somente será sustentável se for capaz de competir com as outras regiões e mesmo com a de outros países. Atualmente é evidente que o cerrado possui vantagens comparativas na produção agrícola, quando comparado a outras regiões.
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O Desenvolvimento Sustentável da agricultura no cerrado brasileiro